Apolo
Nascimento de Apolo e Diana
Apolo e Diana são filhos de Júpiter e de Latona, personificação da Noite, divindade poderosa cuja união com Júpiter produziu o Universo. Segundo a tradição, Latona vê-se, em seguida, relegada ao segundo lugar e quase não aparece na mitologia a não ser como vítima de Juno. A terra, por instigação de Juno, quis impedi-la de achar lugar onde pudesse dar à luz os fIlhos que trazia no seio. Entretanto, Netuno, vendo que a infeliz deusa não encontrava abrigo onde quer que fosse, comoveu-se e fez sair do mar a ilha de Delos. Sendo essa ilha, a princípio, flutuante, não pertencia à Terra, que assim não pôde nela exercer a sua funesta ação.
Delos, diz o hino homérico, rejubilou-se com o nascimento do deus que atira os seus dardos para longe. Durante nove dias e nove noites foi Latona dilacerada pelas cruéis dores do parto. Todas as deusas, as mais ilustres, reúnem-se-lhe em torno. Dionéia, Réa, Têmis que persegue os culpados, a gemedora Anfitrite, todas, exceto Juno dos braços de alabastro, que ficou no palácio de Júpiter. Entretanto, somente Llitia, deusa dos partos, é que ignorava a nova; achava-se sentada no topo do Olimpo, numa nuvem de ouro, retida pelos conselhos de Juno, que sofria um ciúme furioso, porque Latona dos cabelos formosos iria certamente dar à luz um filho poderoso e perfeito.
Então, a fim de levarem Llitia, as demais deusas enviaram de Delos a ligeira Íris, prometendo-lhe um colar de fios de ouro, com nove cúbitos de comprimento. Recomendam-lhe sobretudo que a advirta, à revelia de Juno, de medo que esta a detenha com as suas palavras. Íris, rápida como os ventos, mal recebe a ordem, parte e cruza o espaço num instante.
Chegada à mansão dos deuses no topo do Olimpo, Íris persuadiu Llitia, e ambas voam como tímidas pombas. Quando a deusa que preside aos partos chegou a Delos, Latona experimentava as mais vivas dores. Prestes a dar à luz, abraçava uma palmeira e os joelhos apertavam a relva mole. Em breve nasce o deus; todas as deusas dão um grito religioso. Imediatamente, divino Febo, elas te lavam castamente, purificam-te em límpida água e te envolvem num véu branco, tecido delicado, que elas cingem com um cinto de ouro. Latona então aleitou Apolo de gládio resplendente. Têmis com as suas imortais mãos oferece-lhe o néctar e a divina Ambrósia. Latona alegrou-se enormemente por ter gerado o valoroso filho que empunha um temível arco. Apolo e Diana nasceram, pois, em Delos, e é por isso que Apolo se chama, frequentemente o deus de Delos.
Latona e a serpente Pitã
Entretanto Juno, não conseguindo perdoar à rival ter sido amada por Júpiter, instigou contra ela um monstruoso dragão, filho da Terra, chamado Delfíneo ou Pitão, que fora incumbido da guarda dos oráculos da Terra, perto da fonte de Castália. Obedecendo às sugestões de Juno, Pitão perseguia sem cessar a infeliz deusa, que escapava da sua presença apertando entre os braços os filhos. Num vaso antigo, vemo-lo sob a forma de uma longa serpente que ergue a cabeça, desenrolando o corpo, e persegue Latona. A deusa teme, enquanto os filhos, que não percebem o perigo, estendem os bracinhos para o monstro.
Os Camponeses Carianos
Quando Latona, perseguida pela implacável Juno, fugia com os dois filhos ao colo, chegou à Caria. Num dia de intenso calor, deteve-se aniquilada pela sede e pelo cansaço às margens de um tanque do qual não ousava aproximar-se. Mas alguns camponeses ocupados em arrancar caniços impediram-na de beber, expulsando-a brutalmente. A infeliz Latona rogou-lhes, em nome dos filhinhos, que lhe permitissem sorver umas gotas de água, mas eles a ameaçaram se não afastasse quanto antes e turvaram as águas com os pés e as mãos, a fim de que a lama revolvida aparecesse à tona. A cólera de que Latona se sentiu possuída fez com que se esquecesse da sede, e lembrando-se de que era deusa:
Pois bem, disse-lhes, erguendo as mãos ao céu, ficareis para sempre neste tanque.
O efeito seguiu de perto a ameaça, e aqueles desalmados se viram transformados em rãs. Desde então, não cessam de coaxar com voz rouca e de chafurdar na lama. Alguns lobos, mais humanos que os camponeses, conduziram-na às margens do Xanto e Latona pôde fazer as suas abluções nesse rio, que foi consagrado a Apolo. Rubens, no museu de Munich e Albane possuem quadros em que vemos Latona e os filhos na presença dos camponeses de Caria, que a repelem e se transformam em rãs. Na fonte de Latona, em Versalhes, Balthazar Marsy representou a deusa. com os dois meninos, implorando a vingança do céu contra os insultos dos camponeses. Cá e lá, rãs, lagartos, tartarugas, camponeses e camponesas cuja metamorfose se inicia, lançam contra Latona jatos de água que se cruzam em todos os sentidos.
O Tipo de Apolo
Esplendente é o epíteto que se dá a Apolo, considerado deus solar. Apolo atira ao longe as suas setas, porque o sol dardeja ao longe os seus raios. É o deus profeta, porque o sol ilumina na sua frente e vê, por conseguinte, o que vai suceder; é o condutor das Musas e o deus da inspiração, porque o sol preside às harmonias da natureza; é o deus da medicina, porque o sol cura os doentes com o seu benéfico calor.
Apolo, o Sol, o mais belo dos poderes celestes, o vencedor das trevas e das forças maléficas, tem sido representado pela arte sob vários aspectos. Nos tempos primitivos, um pilar cônico, colocado nas grandes estradas, bastava para lembrar o poder tutelar do deus. Quando nele se pendem as armas, é o deus vingador que premia e castiga; quando nele se pendura uma cítara, torna-se o deus cujos harmoniosos acordes devolvem a calma à alma agitada.
O Apolo de Amicleu, reproduzido em medalhas, pode dar uma ideia do que eram, na época arcaica as primeiras imagens do deus sensivelmente afastadas do tipo que a arte adotou mais tarde. Em bronzes de data menos antiga, mas ainda anteriores à grande época, Apolo está representado com formas mais vigorosas do que elegantes, e os anéis achatados da sua cabeleira o aproximam um pouco das figuras de Mercúrio.
No tipo que tem dominado, Apolo usa cabelos longuíssimos, separados por uma risca no meio da cabeça e afastados de cada lado da testa. Às vezes, eles se prendem atrás, na nuca, mas, outras, flutuam. Vários bustos e moedas nos mostram tais diferentes aspectos. Apolo é sempre representado jovem e emberbe, porque o sol não envelhece. Algumas das suas estátuas o mostram até com os caracteres da adolescência, por exemplo, o Apollino de Florença. No Apolo Sauróctone, o jovem deus está acompanhado de um lagarto. Apolo, sem caráter, é considerado o sol nascente, ou o sol da primavera, porque a presença do lagarto coincide com os seus primeiros raios.
O grifo é um animal fantástico, que vemos frequentemente perto da imagem do deus ou atrelado ao seu carro. Tem a cabeça e as asas de águia, com corpo, patas e cauda de leão. Os grifos têm por missão guardar os tesouros que as entranhas da terra ocultam e é para obter o ouro de que são detentores, que os Arimaspes lutam constantemente contra eles. Os combates constituem o tema de grandíssimo número de representações, principalmente em terracotas ou em vasos. Os Arimaspes são guerreiros fabulosos, que usam vestes análogas à das amazonas.
Delfos, Centro do Mundo
O sol vê antes dos homens porque produz a luz com os seus raios; é por isso que prevê o futuro e pode revela-lo aos homens. Esse caráter profético é um dos atributos essenciais de Apolo; dá os seus oráculos no templo de Delfos, situado no centro do mundo. Ninguém duvida de tal fato, porque tendo Júpiter soltado duas pombas nas duas extremidades da terra, elas voltaram a encontrar-se justamente no ponto em que está o altar de Apolo. Assim, em vários vasos, vemos Apolo sentado no omphalos (o umbigo da terra), de onde dá os oráculos.
Delfos chama-se também à vezes Pito, do nome da serpente Pitão, que ali foi morta por Apolo. Apolo, provido de temíveis setas, quis experimenta-las ferindo o perseguidor da sua mãe. Mal o monstro se sente atingido, é presa das mais vives dores e, respirando com esforço, rola sobre a areia, assobia espantosamente, torce-se em todas as direções, atira-se ao meio da floresta e morre exalando o hálito empestado. Apolo contentíssimo com o triunfo exclama:
“Que o teu Corpo seco apodreça nesta terra fértil; não serás mais o flagelo dos mortais que se nutrem dos frutos da terra fecunda, e eles virão imo1ar-me aqui magníficas hecatombes; nem Tifeu, nem a odiosa Quimera poderão arrancar-te à morte; a terra e o sol no seu curso celeste farão apodrecer aqui o teu cadáver.” (Hino homérico).
Aquecido pelos raios do sol o monstro começa a apodrecer. Foi assim que aquela região tomou o nome de Pito: os habitantes deram ao deus o nome de Pitio, porque em tais lugares o sol, os seus raios devoradores, decompôs o terrível monstro. Segundo as narrações dos poetas, o fato deve ter-se verificado quando Apolo era ainda adolescente, mas o crescimento dos deuses não está submetido às mesmas leis que o dos homens, e quando os escultores representam a vitória de Apolo, mostram o deus com as feições de um jovem que já atingiu a plenitude da força. É o que se nos depara numa das maiores obras-primas da escultura antiga, o Apolo do Belvedere. Essa estátua, de mármore de Luni, foi descoberta no fim do século quinze, perto de Capo d’Anzo, outrora Antium, e, adquirida pelo papa Júlio II, então cardeal em vésperas de ser eleito para o pontificado, mandou que a colocassem nos jardins do Belvedere. Todas as fórmulas da admiração foram esgotadas diante do Apolo do Belvedere, e a estátua, desde que se tomou conhecida, não deixou de provocar o entusiasmo dos artistas.
A Disputa do Tripé
Apolo, após matar a serpente Pitão, envolveu o tripé com a pele do monstro que, antes dele, possuía o oráculo. Uma medalha de Crotona nos mostra o tripé entre Apolo e a serpente: o deus dispara a seta contra o inimigo. Foi por ocasião dessa vitória que Apolo institui os jogos pítios. Urna vivíssima disputa, frequentemente representada nos baixos-relevos da época arcaica, verificou-se entre Apolo e Hércules em torno do famoso tripé. Hércules consulta Pítia em circunstância na qual esta se recusara a responder. O herói, enfurecido, apoderou-se do tripé que Apolo resolveu imediatamente reconquistar. Foi tão viva a luta entre os dois combatentes que Júpiter se viu obrigado a intervir mediante o raio. O tripé de Apolo foi frequentemente representado na arte antiga, e restam-nos monumentos em que vemos até que ponto se unia o bom gosto à riqueza na escultura ornamental dos antigos.
O Oráculo de Delfos
O oráculo de Apolo, em Delfos, era o mais famoso da Grécia. Foi o acaso que levou ao descobrimento do lugar em que deveria erguer-se o santuário. Umas cabras errantes nos rochedos do Parnaso, aproximando-se de um buraco do qual saíam exalações malignas, foram tomadas de convulsões. Acorrendo a notícia daquele prodígio, os habitantes da vizinhança quiseram respirar as mesmas exalações e experimentar os mesmos efeitos, uma espécie de loucura, misto de contorções e brados, e seguida de dom de profecia. Tendo-se alguns frenéticos atirado ao abismo de onde proviam os vapores proféticos, colocou-se sobre o buraco uma máquina chamada tripé por três pés sobre os quais pousava, e escolheu-se uma mulher para a ele subir e poder, sem risco, receber a embriagadora exalação.
Na origem, a resposta do deus, tal qual a davam os sacerdotes, era sempre formulada em versos; mas tendo tido um filósofo a ideia de perguntar porque o deus da poesia se exprimia em maus versos, a ironia foi repetida por todos, e o deus passou a falar somente em prosa, o que lhe aumentou o prestígio. A crença de que o futuro pudesse ser predito de maneira certa pelos oráculos, desenvolveu singularmente na Antiguidade a ideia da fatalidade, que em nenhuma parte transparece tão nitidamente como na lenda de Édipo; os seus esforços não conseguem livra-lo à sentença que lhe foi anunciada pelo oráculo, e tudo quanto ele faz para evitar o destino só lhe acelera os inclementes decretos.
O Caos
O estado primordial, primitivo do mundo é o Caos. Era, segundo os poetas, uma matéria que existia desde tempos imemoriais, sob uma forma vaga, indefinível, indescritível, na qual se confundiam os princípios de todos os seres particulares. Caos era ao mesmo tempo uma divindade, por assim dizer, rudimentar, capaz, porém, de fecundar. Gerou primeiro a Noite, e depois o Érebo.
A Noite
A Noite, deusa das Trevas, filha do Caos, é na verdade a mais antiga das divindades. Certos poetas a consideram como filha do Céu e da Terra; Hesíodo dá-lhe um lugar entre os Titãs e o nome de Mãe dos Deuses, porque sempre se acreditou que a Noite e as trevas haviam precedido a todas as coisas. Desposou Érebo, seu irmão, de quem teve o Éter e o Dia. Mas sozinha, sem unir-se a nenhuma outra divindade, procriara o Inevitável e Inflexível Destino, a Parca Negra, a Morte, o Sono, a legião dos Sonhos, Momo, a Miséria, as Hespérides, guardadoras dos pomos de ouro, as desapiedadas Parcas, a terrível Nemesias, a Fraude, a Concupiscência, a triste Velhice e a obstinada Discórdia; em resumo, tudo quanto havia de doloroso na vida passava por ser obra da Noite. Algumas vezes dão-lhe os nomes gregos de Eufrone e Eulalia, isto é – Mãe do bom conselho. Há quem marque o seu Império ao norte do Ponto-Euxino, no país dos Cimérios; mas a situação geralmente aceita é na parte da Espanha, – a Esméria, na região do poente, perto das colunas de Hércules, limites do mundo conhecido dos antigos.
Quase todos os povos da Itália viam a Noite, ora com um manto volante, recamado de estrelas, por cima de sua cabeça, ou com um outro manto azul e archote derrubado, ora representada por uma mulher nua, com longas asas de morcego e um fanal na mão. Representam-na também coroada de papoulas e envolta num grande manto negro, estrelado. Às vezes num carro arrastado por dois cavalos pretos ou por dois mochos, e a deusa cobre a cabeça com um vasto véu semeado de estrelas. Muito frequentemente colocam-na no Tártaro, entre o Sono e a Morte, seus dois filhos. Algumas vezes um menino precede-a, empunhando uma tocha, – símbolo do crepúsculo. Os romanos não a punham em carro, e representavam-na ociosa e adormecida.
O Érebo
O Érebo, filho do Caos, irmão e esposo da Noite, pai do Éter e do Dia, foi metamorfoseado em rio e precipitado nos Infernos, por ter socorrido os Titãs. Faz parte do Inferno e é mesmo considerado como o próprio Inferno. Pela palavra Éter, os gregos compreendiam os Céus, separados dos corpos luminosos. O vocábulo dia, sendo feminino em grego (Hèméra); dizia-se que o Éter e o Dia foram o pai e a mãe do Céu. Essas estranhas uniões significam somente que a Noite existia antes da criação, que a Terra estava perdida na obscuridade que a cobria, mas que a luz, penetrando através do Éter, havia aclarado o universo. Em linguagem de menor valor mitológico, poderia se simplificar, e dizer que a Noite e o Caos precederam à criação dos céus e da luz.
Eros e Anteros
Foi pela intervenção de um poder divino, eterno como os elementos do próprio Caos, pela intervenção manifesta de um deus que, sem ser propriamente o amor, tem, entretanto, alguma conformidade com ele, que o Caos, a Noite, o Érebo puderam unir-se para a procriação.
Em grego, esse deus antigo, ou melhor, anterior a toda antiguidade, chama-se Eros. É ele que inspira ou produz esta invisível simpatia entre os seres, para os unir em outras procriações. O poder de Eros vai além da natureza viva e animada: ele aproxima, une, mistura, multiplica, varia as espécies de animais de vegetais, de minerais, de líquidos, de fluídos, em uma palavra, de toda a criação. Eros é, pois, o deus da união, da afinidade universal; nenhum outro ser pode furtar-se à sua Influência ou à sua força: Eros é Invencível. Entretanto, tem como adversário no mundo divino – Anteros, isto é, a antipatia, a aversão. Esta divindade tem todos os atributos opostos aos do deus Eros: separa, desune, desagrega. Tão salutar, tão forte e poderoso talvez como Eros, Anteros impede que se confundam os seres da natureza dessemelhantes; se algumas vezes semeia em torno de si a discórdia e o ódio, se prejudica a afinidade dos elementos, ao menos a hostilidade que entre eles cria contém cada um nos limites marcados, e destarte a natureza não pode cair novamente no caos.
O Destino
O Destino é uma divindade cega, inexorável nascida da Noite e do Caos. Todas as outras divindades estavam submetidas ao seu poder. Os céus, a terra, o mar e os infernos faziam parte do seu império: o que resolvia era irrevogável; em resumo, o Destino era por si mesmo essa fatalidade, segundo a qual tudo acontecia no mundo. Júpiter, o mais poderoso dos deuses, não pode aplacar o Destino, nem a favor dos outros deuses, nem a favor dos homens.
As leis do Destino eram escritas desde o princípio da criação em um lugar onde os deuses podiam consulta-las. Os seus ministros eram as três Parcas encarregadas de executar as ordens. Representam-no tendo sob os pés o globo terrestre, e agarrando nas estrelas, e um cetro, símbolo do seu poder soberano. Para mostrar que era inflexível os antigos o representavam por uma roda que prende uma cadeia. No alto da roda uma grande pedra, e embaixo duas cornucópias com pontas de azagaia. Conta Homero que o Destino de Aquiles e de Heitor é pesado na balança de Júpiter, e como a sorte do último o arrebata, sua morte é decretada, e Apolo retira o apoio que lhe dispensara até então. São as leis cegas do Destino que tornaram culpados a tantos mortais, apesar do seu desejo de permanecer virtuosos: em Ésquilo, por exemplo, Agamemnom, Clitemnestre, Jocasta, Édipo, Eteoclo, Polínice, etc., não podem fugir à sua sorte. Só os oráculos podiam entrever e revelar o que estava escrito no livro do Destino.
Terra (Gaia)
A Terra, Mãe Universal de todos os seres, nasceu imediatamente depois do Caos. Desposou Urano ou o Céu, foi a mãe dos deuses e dos gigantes, dos bens e dos males, das virtudes e dos vícios. Fazem-na unir-se com o Tártaro e Ponto, ou o Mar, cujas uniões os monstros que encerram todos os elementos. A Terra, às vezes tomada pela Natureza, tinha vários nomes: Titéia, Ops, Telus, Vesta e mesmo Cibele.
Dizia-se que o homem nascera da terra embebida d’água e aquecida pelos raios do Sol; assim, a sua natureza participa de todos os elementos, e quando morre, sua mãe venerável o recolhe e o guarda no seu seio. Na Mitologia, muitas vezes é considerado entre os filhos da Terra; geralmente, quando não se sabia a origem, quer de um homem, quer de um povo célebre, dava-se-Ihe o nome de filho da Terra.
Algumas vezes a Terra é representada pela figura de uma mulher sentada num rochedo; as alegorias modernas descrevem-na sob os traços de uma venerável matrona, sentada sobre um globo, coroada de torres, empunhando uma cornucópia cheia de frutos. Outras vezes aparece coroada de flores, tendo a seu lado o boi que lavra a terra, o carneiro que se ceva e o mesmo leão que está aos pés de Cibele. Em um quadro de Lebrun, a Terra é personificada por uma mulher que faz jorrar o leite dos seus seios, enquanto se desembaraça do seu manto, e do manto surge uma nuvem de pássaros que revoa nos ares.
Telus
Telus, Deusa da Terra, munas vezes tomada pela própria Terra, é chamada pelos poetas a Mãe dos Deuses. Ela representa o solo fértil, e também o fundamento sobre que repousam os elementos que se geram entre si. Diziam-na mulher do Solou do Céu porque tanto a um como ao outro deve a sua fertilidade. Era representada como uma mulher corpulenta, com uma grande quantidade de peitos. Frequentemente se confundem Telus e Terra com Cibele. Antes de estar de posse do oráculo de Delfos, era Telus que o possuía e que o divulgava; mas em tudo estava em meias com Netuno. Depois, Telus cedeu os seus direitos a Temis, e Temis a Apolo.
Urano ou Coelo (Ouranos)
Urano ou Coelo, o Céu, era filho do Éter e do Dia. Segundo Hesíodo, era filho do Éter e da Terra. De qualquer maneira desposou Titéia, isto é a Terra ou Vesta, que, neste caso, é distinta de Vesta, Deusa do Fogo e da virgindade. Diz-se que Urano teve quarenta e cinco filhos de várias mulheres, sendo que, destes, dezoito eram de Titéia; os principais foram Titã, Saturno e Oceano que se revoltaram contra seu pai e o impossibilitaram de ter filhos. Cheio de mágoa e em consequência da mutilação de que fora vítima, Urano morreu.
O que caracteriza as divindades das primeiras idades mitológicas é um brutal egoísmo junto a uma desapiedada crueldade. Urano tomara aversão a todos os seus filhos: desde que nasciam, encerrava-os em um abismo e não os deixava ver o dia. Foi isto que motivou a revolta. Saturno, sucessor de Urano, foi tão cruel como o pai.
Titéia
Titéia, a antiga Vesta, mulher de Urano, foi a mãe dos Titãs, nome que significa filhos de Titéia ou da Rena. Além de Titã propriamente dito, de Saturno e Oceano ela teve Hipérion, Japeto, Tia, Réia ou Cibele, Temis, Minemosine, Febe, Tétis, Brontes, Steropes, Argeu, Coto, Briareu, Giges. Com Tártaro teve o gigante Tifon, que se distinguiu na guerra contra os Deuses.
Saturno (Cronos)
Filho segundo de Urano e da antiga Vesta, ou do Céu e da Terra, Saturno, depois de haver destronado o pai, obteve de seu irmão primogênito Titã o favor de reinar em seu lugar. Mas Titã impôs uma condição, – a de Saturno fazer morrer toda a sua posterioridade masculina, a fim de que a sucessão ao trono fosse reservada aos seus filhos. Saturno desposou Réia, de quem teve muitos filhos, que devorou avidamente, conforme combinara com seu irmão. Além disso, sabendo que, um dia, ele próprio seria derrubado do trono por um dos seus filhos, exigia que sua esposa lhe entregasse os recém-nascidos. Entretanto Réia conseguiu salvar a Júpiter, que quando grande, declarou guerra a seu pai, venceu-o, e depois de o haver tratado como o fora Urano por seus filhos, pô-lo fora do céu. Assim a dinastia de Saturno continuou em prejuízo da de Titã.
Saturno teve três filhos de Réia, que conseguiu salva-los: Júpiter, Netuno e Plutão, e uma filha, Juno, Irmã gêmea e esposa de Júpiter. Alguns autores, ao número das filhas de Saturno e Réia, acrescentam Vesta, deusa do fogo, e Ceres, deusa das searas. De resto, Saturno teve, com muitas outras mulheres, um grande número de filhos como, por exemplo, o centauro Chiron, filho da ninfa Filira etc.
Conta-se que Saturno, destronado por seu filho Júpiter, reduzido à condição de simples mortal, foi refugiar-se na Itália, no Lácio, onde reuniu os homens ferozes, esparsos nas montanhas, e lhes deu leis. O seu reinado foi a idade do ouro, sendo os seus pacíficos súditos governados com doçura. Foi restabelecida a igualdade das condições; nenhum homem servia a outro como criado; ninguém possuía coisa alguma exclusivamente para si; tudo era bem comum, como se todo mundo tivesse tido a mesma herança. Para lembrar esses tempos felizes, celebravam-se em Roma as Saturnais. Essas festas, cuja instituição remontava no passado muito além da fundação da cidade, consistiam sobretudo em representar a igualdade que primitivamente reinava entre os homens.
Começavam as Saturnais no dia 16 de dezembro de cada ano; ao princípio só duravam um dia, mas ordenou o Imperador Augusto que durariam três; Calígula aumentou-lhes vinte e quatro horas. Durante estas festas se suspendia o poder dos senhores sobre os escravos, e estes tinham inteiramente livres a palavra e as ações. Então, tudo era prazer, tudo era alegria; nos tribunais e nas escolas havia férias; era proibido empreender uma guerra, executar um criminoso ou exercer outra arte além da culinária; trocavam-se presentes e davam-se suntuosos banquetes. De mais a mais todos os habitantes da cidade paravam as suas tarefas; toda a população se dirigia ao monte Aventino para respirar o ar do campo. Os escravos podiam criticar os defeitos dos seus senhores, fazer-lhes partidas, e nesses dias eram os senhores que serviam os escravos, à mesa.
Em grego, Saturno é designado pelo nome de Cronos, que quer dizer o Tempo. A alegoria é transparente nesta fábula de Saturno; este deus que devora os filhos é, diz Cícero, o Tempo, o Tempo que se não sacia dos anos e que consome todos aqueles que passam. A fim de o conter, Júpiter o acorrentou, isto é submeteu-o ao curso dos astros que são como laços que o prendem. Os cartagineses ofereciam a Saturno sacrifícios humanos; as vítimas eram crianças recém-nascidas. Nesses sacrifícios, as flautas, os tímpanos, os tambores faziam um ruído tão grande que não se ouviam os gritos da criança imolada.
Em Roma, o templo elevado a esse deus no pendor do Capitólio, foi o depósito do tesouro público, em lembrança de que no tempo de Saturno, na idade do ouro, não se cometiam furtos. A sua estátua estava amarrada com cadeias que só se tiravam em dezembro, durante as Saturnais. Saturno era geralmente representado como um velho curvado ao peso dos anos, erguendo na mão uma foice para mostrar que preside ao tempo. Em muitos monumentos apresentam-no com um véu, sem dúvida porque os tempos são obscuros e cobertos de um segredo impenetrável. Com um globo na cabeça é o planeta Saturno. Numa gravura, talvez etrusca, é representado com asas e a foice pousada sobre um globo; é assim que representamos sempre o tempo. O dia de Saturno é Sábado (Saturni Dies), em francês, samedi, em inglês, saturday.
Mito, Rito e Religião
É necessário deixar bem claro, nesta tentativa de conceituar o mito, que o mesmo não tem aqui a conotação usual de fábula, lenda, invenção, ficção, mas a acepção que lhe atribuíam e ainda atribuem as sociedades arcaicas, as impropriamente denominadas culturas primitivas, onde mito é o relato de um acontecimento ocorrido no tempo primordial, mediante a intervenção de entes sobrenaturais. Em outros termos, mito, é o relato de uma história verdadeira, ocorrida nos tempos dos princípios, quando com a interferência de entes sobrenaturais, uma realidade passou a existir, seja uma realidade total, o cosmo, ou tão-somente um fragmento, um monte, uma pedra, uma ilha, uma espécie animal ou vegetal, um comportamento humano. Mito é, pois, a narrativa de uma criação: conta-nos de que modo algo, que não era, começou a ser.
De outro lado, o mito é sempre uma representação coletiva, transmitida através de várias gerações e que relata uma explicação do mundo. Mito é, por conseguinte, a parole, a palavra revelada, o dito. E, desse modo, se o mito pode se exprimir ao nível da linguagem, ele é antes de tudo, uma palavra que circunscreve e fixa um acontecimento. O mito é sentido e vivido antes de ser inteligido e formulado. Mito é a palavra, a imagem, o gesto, que circunscreve o acontecimento no coração do homem, emotivo como uma criança, antes de fixar-se como narrativa.
O mito expressa o mundo e a realidade humana, mas cuja essência é efetivamente uma representação coletiva, que chegou até nós através de várias gerações. E, na medida em que pretende explicar o mundo e o homem, isto é a complexidade do real, o mito não pode ser lógico: ao revés, é ilógico e irracional. Abre-se como uma janela a todos os ventos; presta-se a todas as interpretações. Decifrar o mito é, pois, decifrar-se. E, como afirma Roland Barthes, o mito não pode, consequentemente, ser um objeto, um conceito ou uma ideia: ele é um modo de significação, uma forma. Assim, não se há de definir o mito pelo objeto de sua mensagem, mas pelo modo como a profere. É bem verdade que a sociedade industrial usa o mito como expressão de fantasia, de mentiras, daí mitomania, mas não é este o sentido que hodiernamente se lhe atribui.
O mesmo Roland Barthes, aliás, procurou reduzir, embora significativamente, o conceito de mito, apresentando-o como qualquer forma substituível de uma verdade. Uma verdade que esconde outra verdade. Talvez fosse mais exato defini-lo como uma verdade profunda de nossa mente. É que poucos se dão ao trabal1o de verificar a verdade que existe no mito, buscando apenas a ilusão que o mesmo contém. Muitos veem no mito tão-somente os significantes, isto é a parte concreta do signo. É mister ir além das aparências e buscar-lhe os significados, quer dizer, a parte abstrata, o sentido profundo. Talvez se pudesse definir mito, dentro do conceito de Carl Gustav Jung, como a conscientização de arquétipos do inconsciente coletivo, quer dizer, um elo entre o consciente e o inconsciente coletivo, bem como as formas através das quais o inconsciente se manifesta. Compreende-se por inconsciente coletivo a herança das vivências das gerações anteriores. Desse modo, o inconsciente coletivo expressaria a identidade de todos os homens, seja qual for a época e o lugar onde tenham vivido.
Arquétipo, do grego “arkhétypos”, etimologicamente, significa modelo primitivo, ideias inatas. Como conteúdo do inconsciente coletivo foi empregado pela primeira vez por Yung. No mito esses conteúdos remontam a uma tradição, cuja idade é impossível determinar. Pertencem a um mundo do passado, primitivo, cujas exigências espirituais são semelhantes à que se observam entre culturas primitivas ainda existentes. Normalmente, ou didaticamente, se distinguem dois tipos de imagens:
Imagens (incluídos os sonhos) de caráter pessoal, que remontam a experiências pessoais esquecidas ou reprimidas, que podem ser explicadas pela anamnese individual;
Imagens (incluídos os sonhos) de caráter impessoal, que não podem ser incorporados à história individual. Correspondem a certos elementos coletivos: são hereditárias.
A palavra textual de Jung ilustra melhor o que expôs: Os conteúdos do inconsciente pessoal são aquisições da existência individual, ao passo que os conteúdos do inconsciente coletivo são arquétipos que existem sempre a priori. Embora se tenha que admitir a importância da tradição e da dispersão por migrações, casos há, e muito numerosos, em que essas imagens pressupõem uma camada psíquica coletiva: é o inconsciente coletivo. Mas, como este não é verbal, quer dizer, não podendo o inconsciente se manifestar de forma conceitual, verbal, ele o faz através de símbolos. Atente-se para a etimologia de símbolo, do grego “symbolon”, do verbo “symbállein”, lançar com, arremessar ao mesmo tempo, com jogar.
De inicio o símbolo era um sinal de reconhecimento: um objeto dividido em duas partes, cujo ajuste e confronto permitiam aos portadores de cada uma das partes se reconhecerem. O símbolo é, pois, a expressão de um conceito de equivalência. Assim para se atingir o mito, que se expressa por símbolos, é preciso fazer uma equivalência, uma conjugação, uma reunião, porque, se o signo é sempre menor do que o conceito que representa, o símbolo representa sempre mais do que seu significado evidente e imediato. Em síntese os mitos são a linguagem imagística dos princípios. Traduzem a origem de uma instituição, de um hábito, a lógica de uma gesta, a economia de um encontro.
Na expressão de Goethe, os mitos são as relações permanentes da vida. Se mito é, pois, uma representação coletiva, transmitida através de várias gerações e que relata uma explicação do mundo, então o que é mitologia? Se mitologema é a soma dos elementos antigos transmitidos pela tradição e mitema as unidades constitutivas desses elementos, mitologia é o movimento desse material: algo de estável e mutável simultaneamente, sujeito, portanto, a transformações. Do ponto de vista etimológico, mitologia é o estudo dos mitos, concebidos como história verdadeira. Quanto à religião, do latim religione, a palavra possivelmente se prende ao verbo religare, ação de ligar. Religião pode, assim, ser definida como o conjunto das atitudes e atos pelos quais o homem se prende, se liga ao divino ou manifesta sua dependência em relação a seres Invisíveis tidos como sobrenaturais.
Tomando-se o vocábulo num sentido mais estrito, pode-se dizer que a religião para os antigos é a reatuatização e a ritualização do mito. O rito possui o poder de suscitar ou, ao menos, de reafirmar o mito. Através do rito, o homem se incorpora ao mito, beneficiando-se de todas as forças e energias que jorraram nas origens. A ação ritual realiza no imediato uma transcendência vívida. O rito toma, nesse caso, o sentido de uma ação essencial e primordial através da referência que se estabelece do profano ao sagrado. Em resumo: o rito é a práxis do mito. É o mito em ação. O mito rememora, o rito comemora.
Rememorando os mitos, reatualizando-os, renovando-os por meio de certos rituais, o homem toma-se apto a repetir o que os deuses e os heróis fizeram nas origens, porque conhecer os mitos é aprender o segredo da origem das coisas. E o rito pelo qual se exprime (o mito) reatualiza aquilo que é ritualizado: recriação, queda, redenção. E conhecer a origem das coisas de um objeto, – de um nome, de um animal ou planta – equivale a adquirir sobre as mesmas um poder mágico, graças ao qual é possível domina-las, multiplicá-las ou reproduzi-las à vontade. Esse retomo às origens por meio do rito, é de suma importância, porque voltar às origens é readquirir as forças que jorraram nessas mesmas origens.
Não é em vão que na Idade Média muitos cronistas começavam suas histórias com a origem do mundo. A finalidade era recuperar o tempo forte, o tempo primordial e as bênçãos que jorraram ilo tempore. Além do mais, o rito, reiterando o mito, aponta o caminho, oferece um modelo exemplar, colocando o homem na contemporaneidade do sagrado. É o que nos diz. com sua autoridade, Mircea Eliade: Um objeto ou um ato nulo se tomam reais, a não ser na medida em que repetem um arquétipo. Assim a realidade se adquire exclusivamente pela repetição ou participação; tudo que não possui um modelo exemplar é vazio de sentido, isto é, carece de realidade. O rito, que é o aspecto litúrgico do mito, transforma a palavra em verbo, sem o que ela é apenas lenda, legenda, o que deve ser lido e não mais proferido.
À ideia de reiteração prende-se a ideia de tempo. O mundo transcendente dos deuses e heróis é religiosamente acessível e reatualizável, exatamente porque o homem das culturas primitivas não aceita a irreversibilidade do tempo: o rito abole o tempo profano, cronológico, é linear e, por isso mesmo, irreversível (pode-se comemorar uma data histórica, mas não fazê-la voltar no tempo), o tempo mítico, ritualizado, é circular, voltando sempre sobre si mesmo. É precisamente essa reversibilidade que liberta o homem do peso do tempo morto, dando-lhe a segurança de que ele é capaz de abolir o passado, de recomeçar sua vida e recriar seu mundo. O profano é tempo da vida; o sagrado, o tempo da eternidade.
A consciência mítica, embora rejeitada no mundo moderno, ainda está viva e atuante nas civilizações denominadas primitivas: o mito, quando estudado ao vivo, não é uma explicação destinada a satisfazer a uma curiosidade científica, mas uma narrativa que faz reviver uma realidade primeva, que satisfaz as profundas necessidades religiosas, aspirações morais, a pressões e a imperativos de ordem social e mesmo a exigências práticas. Nas civilizações primitivas, o mito desempenha uma função indispensável: ele exprime, exalta e codifica a crença; salvaguarda e impõe os princípios morais; garante a eficácia do ritual e oferece regras práticas para a orientação do homem. O mito é um ingrediente vital da civilização humana; longe de ser uma fabulação vã, ele é ao contrário, uma realidade viva, a qual se recorre incessantemente; não é. absolutamente uma teoria abstrata ou uma fantasia artística, mas uma verdadeira codificação da religião primitiva e da sabedoria prática.
Cupido
Nascimento de Cupido
Cupido nos tempos primitivos é considerado um dos grandes princípios do universo e até o mais antigo dos deuses. Representa a força poderosa que faz com que todos os seres sejam atraídos uns pelos outros, e pela qual nascem e se perpetuam todas as raças. Mitologicamente, não sabemos quem é seu pai, mas os poetas e escultores concordam em lhe dar Vênus por mãe, e é realmente naturalissimo que Cupido seja filho da beleza. O nascimento de Cupido proporcionou a Lesueur os itens de uma encantadora composição. Vênus sentada nas nuvens está rodeada das três Graças, uma das quais apresenta o gracioso menino. Uma das Horas, que paira no céu esparge flores sobre o grupo.
Educação de Cupido
Notando Vênus que Eros (Cupido) não crescia e permanecia sempre menino, perguntou o motivo a Têmis. A resposta foi que o menino cresceria quando tivesse um companheiro que o amasse. Vênus deu-lhe, então, por amigo Anteros (o amor partilhado). Quando estão juntos, Cupido cresce, mas volta a ser menino quando Anteros o deixa. É uma alegoria cujo sentido é que o afeto necessita de ser correspondido para desenvolver-se.
A educação de Cupido por Vênus proporcionou assunto para uma multidão de maravilhosas composições em pedras gravadas. Vênus brinca com ele de mil modos diversos, pegando-lhe o arco ou as setas e seguindo-lhe com o olhar os graciosos movimentos. Mas o malicioso menino vinga-se, e várias vezes a mãe experimenta o efeito das suas flechadas. Cupido era frequentemente considerado um civilizador que soube mitigar a rudeza dos costumes primitivos. A arte apoderou-se dessa ideia, apresentando-nos os animais ferozes submetidos ao irresistível poder do filho de Vênus. Nas pedras gravadas antigas vemos Cupido montado num leão a quem enfeitiçou com os seus acordes; outras vezes atrela animais ferozes ao seu carro, após domesticá-los, ou então quebra os atributos dos deuses, porque o universo lhe está submetido. Não obstante o seu poder, jamais ousou atacar Minerva e sempre respeitou as Musas.
Cupido é o espanto dos homens e dos deuses. Júpiter, prevendo os males que ele causaria, quis obrigar Vênus a desfazer-se dele. Para o furtar à cólera do senhor dos deuses, viu-se Vênus obrigada a ocultá-lo nos bosques, onde ele sugou o leite de animais ferozes. Também os poetas falam sem cessar da crueldade de Cupido:
“Formosa Vênus, filha do mar e do rei do Olimpo, que ressentimento tens contra nós? Por que deste a vida a tal flagelo, Cupido, o deus feroz, impiedoso, cujo espírito corresponde tão pouco aos encantos que o embelezam? Por que recebeu asas e o poder de lançar setas, a fim de que não pudéssemos safar-nos dos seus terríveis golpes?” (Bíon).
Um epigrama de Mosco mostra a que ponto conhecia Cupido o seu poder, até contra Júpiter:
“Tendo deposto o arco e o archote, Cupido, de cabelos encaracolados, pegou um aguilhão de boieiro e suspendeu ao pescoço o alforje de semeador; depois, atrelou ao jugo uma parelha de bois vigorosos e nos sulcos atirou o trigo de Ceres. Olhando então para o céu, disse ao próprio Júpiter: “Fecunda estes campos, ou então, touro da Europa, eu te atrelarei a este arado..” (Antologia).
Luciano, nos seus diálogos dos deuses, assim formula as queixas de Júpiter a Cupido:
Cupido: – Sim, se cometi um erro, perdoa-me, Júpiter. Sou ainda menino e não atingi a idade da razão.
Júpiter: – Tu, Cupido, um menino?! Mas se é mais velho que Japeto. Por não teres barba nem cabelos brancos, julga-tes ainda menino? Não. És velho e velho maldoso.
Cupido: – E que mal te fez, pois, este velho, como dizes, para que penses em encadeá-lo?
Júpiter: – Vê, pequenino malandro, se não é grande mal insultar-me a ponto de fazeres com que eu me revestisse da forma de sátiro, touro, cisne e água. Não fizeste com que mulher alguma se apaixonasse de mim próprio, e não sei absolutamente que, pelo teu sortilégio, eu tenha conseguido agradar a uma que fosse. Pelo contrário, devo recorrer a metamorfoses e ocultar-me. É verdade que amam o touro ou o cisne, mas se me vissem morreriam de medo. (Luciano).
Cupido inspirou encantadores trechos a Anacreonte: No meio da noite, na hora em que todos os mortais dormem. Cupido chega e, batendo à minha porta, faz estremecer o ferrolho:
Quem bate assim? Exclamei. Quem vem interromper-me os sonhos cheios de encanto?
Abre, responde-me Cupido, não temas, sou pequenino. Estou molhado pela chuva, a lua desapareceu e eu me perdi dentro da noite.
Ouvindo tais palavras apiedei-me; acendo a lâmpada, abro e vejo um menino alado, armado de arco e aljava; levo-o ao pé da lareira, aqueço-lhe os dedinhos entre as minhas mãos, e enxugo-lhe os cabelos encharcados de água. Mal se reanima:
Vamos, diz-se, experimentemos o arco. Vejamos se a umidade o não estragou.
Estica-o, então, e vara-me o coração, como faria uma abelha; depois. salta, rindo com malícia:
Meu hóspede, diz, rejubila-te. O meu arco está funcionando perfeitamente bem, mas o teu coração está agora enfermo.. (Anacreonte).
Um dia, Cupido, não percebendo uma abelha adormecida nas rosas, foi por ela picado. Ferido no dedinho da mão, soluça, corre, voa para o lado de sua mãe:
Estou perdido, morro! Uma serpentezinha alada me picou. Os lavradores dizem Que é uma abelha.
Vênus responde-lhe:
Se o aguilhão de uma simples abelha te faz chorar, meu filho, reflete como devem sofrer aqueles a quem tu atinges com as setas.” (Anacreonte).
Tipo e Atributos de Cupido
Na arte Cupido apresenta dois tipos distintos, pois uma das vezes o vemos como adolescente, outras sob o aspecto de gracioso menino. Mas o primeiro de tais tipos é o mais antigo. Uma pedra gravada nos mostra Cupido de estilo antigo, representado por um efebo alado e disparando uma seta. O arco, as setas e as asas são sempre os atributos de Cupido. O tipo de Cupido adolescente está fixado perfeitamente num tronco do museu Pio-Clementino. Os membros, infelizmente, faltam. Os ombros apresentam vestígios de orifícios abertos para acolherem o pé das asas. A cabeça, de delicada beleza, está coberta de cabelos encaracolados. Foi Praxíteles, contemporâneo de Alexandre, que fixou na arte o tipo de Cupido. Sabe-se que o grande escultor era frequentador assíduo da famosa cortesã Frinéia. Esta, ao lhe pedir um dia que ele lhe cedesse a mais bela das suas estátuas, teve o prazer de ser ouvida. Mas Praxíteles não lhe explicou qual delas seria.
Frinéia, então, mandou que um escravo fosse à casa do escultor, e dali a pouco o escravo voltou dizendo que um incêndio destruíra a casa de Praxíteles e com ela a maior parte dos seus trabalhos; no entanto, acrescentou, que nem tudo desaparecera. Praxíteles precipitou-se imediatamente para a porta, gritando que estaria perdido todo o fruto dos seus longos esforços, se o incêndio lhe não tivesse poupado o Cupido e o Sátiro. Frinéia tranquilizou-o assegurando-lhe que nada estava queimado e que, graças ao ardil, ficara sabendo dele próprio o que de melhor havia em escultura. Escolheu, assim, o Cupido. Mas não era para guarda-la que a cortesã pedira a obra-prima ao grande escultor, pois, na Grécia, os costumes licenciosos não impediam sentimentos elevados.
Frinéia doou a estátua à cidade de Téspies, sua pátria, que Alexandre acabara de devastar. A escultura foi consagrada num antigo templo de Cupido, e foi graças a esse Destino religioso que se tomou espécie de compensação para uma cidade destruída pela guerra.
Téspies já não é mais nada, diz Cícero, mas conserva o Cupido de Praxíteles, e não há viajante que não vá visitá-la para conhecer tão esplêndida obra-prima.
Esse Cupido era de mármore, as asas eram douradas, e ele empunhava o arco. Calígula mandou que o transportassem para Roma; Cláudio devolveu-o aos habitantes de Téspies, Nero roubou-o de novo. A célebre estátua foi, então, colocada em Roma sob os pórticos de Otávio, onde pouco depois a destruiu um incêndio. O escultor Lisipo também fizera uma estátua de Cupido para os habitantes de Téspies, colocada ao lado da obra-prima de Praxíteles. A famosa estátua conhecida pelo nome de Cupido empunhando o arco passa por ser cópia de uma dessas duas obras. Via-se também no templo de Vênus em Atenas um famosíssimo quadro de Zêuxis, representando Cupido coroado de rosas. Até a conquista romana, quase sempre fora Cupido representado como adolescente de formas esbeltas e elegantes.
A partir de tal época, surge mais frequentemente sob o aspecto de menino. A arte dos últimos séculos representou muitas vezes Cupido. No quarto de banho do cardeal Bibbiena, no Vaticano, Rafael fixou Cupido triunfante, fazendo puxar o carro por borboletas, cisnes, etc. Numa multidão de encantadoras composições mostra-o doidejando ao lado de sua mãe ou então abandonando-a, após havê-la picado. Parmeggianino fez com Cupido e o seu arco uma graciosa figura que, por longo tempo foi atribuía a Correggio. Correggio e Ticiano, por sua vez, fixaram Cupido em todas as suas formas, mas nenhum pintor o representou tantas vezes quantas Rubens. Os cupidos frescos e bochechudos do grande mestre flamengo podem ser vistos em todas as galerias, brigando, brincando, voando, correndo, colhendo frutos, etc.
Embora tais composições pequem, uma vez que outra, por um pouco de afetação, é quase sempre encantadora. A maioria foi popularizada pela gravura ou pela litografia. Aqui, vemos Cupido de pé, asas abertas, passar os braços em volta do pescoço da inocência sentada num cabeça. Mais longe, a inocência seduzida por Cupido, é arrastada pelo Prazer e seguida pelo Arrependimento. Outras vezes, o autor representa Cupido preso por um elo de ferro ao pedestal de um busto de Minerva e pisando com o pequenino pé, mas, em troca, outras é Cupido triunfante que se vinga da mulher insensata a qual julgou encadeá-lo para sempre.
Cupido fere várias vezes sem ver, e dá origem a sentimentos que nem o mérito, nem a beleza explicam suficientemente. Foi o que Correggio pretendeu exprimir ao representar Vênus prendendo uma venda sobre os olhos do filho. Ticiano pintou o mesmo tema que se vê reproduzido com frequência na arte dos últimos séculos.
Esaco
Cupido produz naqueles aos quais fere efeitos surpreendentes, que na Lenda se traduzem sempre por metamorfoses. Assim, o mergulhão é uma ave que voa sempre acima das águas e nela mergulha frequentemente. Noutros tempos, tratava-se do filho de um rei, que tinha aversão à corte do pai e evitava participar das festas que ali se realizavam, preferindo ir aos bosques, por ter a esperança de encontrar a ninfa Hespéria a quem amava ternamente. Entretanto Esaco, assim se chamava ele, não era correspondido. Um dia, estando a ninfa a fugir-lhe à perseguição amorosa, foi picada por uma serpente venenosa e morreu. Esaco, desesperado por lhe ter causado morte, atirou-se ao mar do alto de um rochedo. Mas Tétis, comovida, sustentou-o na queda, cobriu-o de penas, antes que ele caísse na água e impediu-o, assim, de morrer, por maior que fosse o seu desejo de não sobreviver à querida Hespéria.
Indignado contra a mão favorável que o protege, queixa-se da crueldade do Destino que o força a viver. Eleva-se no ar, depois se precipita com impetuosidade na água; mas as penas o sustêm e reduzem o esforço que ele faz para morrer. Furioso, mergulha a todo instante no mar, e procura a morte que o evita. O amor tornou-o magro, tem coxas longas e descarnadas e um pescoço muito comprido. Ama as águas, e é pelo fato de nelas mergulhar constantemente que se chama mergulhão. (Ovídio).
Pico e Circe
Pico, filho de Saturno e rei da Itália, era um jovem príncipe de maravilhosa beleza. Todas as ninfas o admiravam quando o viam, mas a feiticeira Circe não se contentou com admira-lo, e quis que ele a desposasse. No entanto, só colheu desdém, pois ele amava perdidamente Canenta, filha de Jano. Um dia, tendo ido caçar javalis, encontrou Circe, que lhe confessou abertamente a sua paixão. Vendo-se desdenhada, a feiticeira proferiu as terríveis palavras de que se serve para fazer empalidecer a lua ou obscurecer o sol. Pico, aterrorizado com as fórmulas mágicas, começou a fugir; mas imediatamente notou que estava correndo muito mais velozmente do que de hábito, ou antes que estava voando, visto que fora metamorfoseado em ave. Na sua cólera, pôs-se a dar fortes bicadas nas árvores; as penas tinham conservado a cor das vestes usadas por ele naquele dia, e o broche de ouro que as prendia ficou assinalado no seu pescoço por uma mancha amarelada, brilhante. Canenta chorou tanto que o seu formoso corpo terminou por se evaporar nos ares, e dela nada mais restou.
O Cabelo de Niso
De todas as metamorfoses operadas por Cupido, não há nenhuma que seja tão surpreendente como a de que foi vítima Cita, filha do rei Niso. O rei de Creta, Minos, após devastar as costas de Megara, iniciara o cerco da cidade, cujo Destino dependia de um cabelo de ouro que Niso, rei do país trazia entre os cabelos brancos. O sito já durava havia seis meses sem que a sorte se declarasse nem por um partido, nem por outro. Em Megara havia uma torre cujas muralhas produziam um som harmonioso desde que Apolo ali deixara a sua lira. A filha do rei, Cila, subia frequentemente, em tempo de paz, a essa torre, para ter o prazer de produzir nas muralhas alguns sons atirando-lhes pequeninas pedras. Durante o cerco, também visitava o mesmo lugar para de lá ver os ataques e os combatentes feridos em tomo da cidade. Como fIzesse bastante tempo que os inimigos se achavam acampados em torno, ela conhecia os principais oficiais, as suas armas, os seus cavalos e a sua maneira de combater. Nota, sobretudo, o chefe, Minos, com particular atenção e mais do que o necessário para a sua tranquilidade, tanto que a paixão atingiu tal ponto que ela resolveu sacrificar o país à glória do estrangeiro a quem amava.
Uma noite, enquanto a cidade inteira estava imersa no sono, penetrou no aposento do pai e cortou-lhe o cabelo fatal. Munida do precioso objeto, a infeliz Cita, a quem o crime dava nova ousadia, saiu da cidade, atravessou o campo inimigo, chegou à tenda de Minos a quem confiou o cabelo do qual dependia a salvação da cidade. Minos sentiu aversão por tão desnaturada filha, e recusou-se a vê-la. O cabelo estava cortado, a cidade caiu entre as mãos dos inimigos, mas Minos partiu imediatamente depois, proibindo o embarque de Cila nos seus navios. Foi em vão que ela alcançou, banhada em lágrimas, a praia, cabelos desalinhados, braços estendidos para o homem que a repelia. Viu partir o navio, e, no seu desespero, atirou-se ao mar para seguir a nado o ente amado. Mas notou seu pai, Niso, que, metamorfoseado em gavião, a perseguia, e começava a cair sobre ela para a dilacerar a bicadas. Assim, em vez de nadar, Cila começou também a voar sobre a superfície da água, pois estava, por sua vez transformada em ca1handra. Desde então a ave de rapina, que ela tão indignamente traira, não cessa de lhe fazer cruel guerra. (Ovídio).
Hércules
Os Trabalhos de Hércules
Hércules (ou Heracles). O maior de todos os heróis gregos. Era filho de Zeus e Alcmena. Alcmena era a virtuosa esposa de Anfitriã e, para seduzi-la, Zeus assumiu a forma de Anfitrião enquanto este estava ausente de casa. Quando seu marido retornou e descobriu o que tinha acontecido, ficou tão irado que construiu uma grande pira e teria queimado Alcmena viva, se Zeus não tivesse mandado nuvens para apagar o fogo, forçando assim Anfitrião a aceitar a situação. Nascido, o jovem Hércules rapidamente revelou seu potencial heroico. Enquanto ainda no berço, ele estrangulou duas serpentes que a ciumenta Hera, esposa de Zeus, tinha mandado para ataca-lo ao seu meio-irmão Íflico; enquanto ainda um menino, ele matou um leão selvagem no Monte Citéron. Na vida adulta, as aventuras de Hércules foram maiores e mais espetaculares do que as de qualquer outro herói. Por toda a antiguidade ele foi muito popular, o assunto de numerosas estórias e incontáveis obras de arte. Apesar das mais coerentes fontes literárias sobre suas façanhas datarem apenas do século 10 a.C., citações espalhadas por vários locais e a evidência de fontes artísticas deixam muito claro o fato que a maioria, se não todas, de suas aventuras era bem conhecida em tempos mais antigos.
Hércules realizou seus famosos doze trabalhos sob o comando de Euristeu, Rei de Argos de Micenas. Existem várias explicações da razão pela qual Hércules se sentiu obrigado a realizar os pedidos cansativos e aparentemente impossíveis de Euristeu. Uma fonte sugere que os trabalhos eram uma penitência imposta ao herói pelo Oráculo de Delfos quando, num acesso de loucura, matou todos os filhos de seu primeiro casamento. Enquanto os seis primeiros trabalhos se passam no Peloponeso, os últimos levaram Hércules a vários lugares na or1a do mundo grego e além. Durante os trabalhos. Hércules foi perseguido pelo ódio da deusa Hera, que tinha ciúmes dos filhos de Zeus com outras mulheres. A deusa Atena, por outro lado, era uma defensora entusiasta de Hércules; ele também desfrutou da companhia e ajuda ocasional de seu sobrinho, Lolau.
O primeiro trabalho de Hércules era matar o leão de Neméia. Como esta enorme fera era invulnerável a qualquer arma, Hércules lutou com ele e acabou estrangulando-o apenas com suas mãos. A seguir, ele removeu a pele utilizando uma de suas garras, e passou a utiliza-la como uma capa, com as patas amarradas ao redor de seu pescoço, as presas surgindo sobre sua cabeça e a cauda balançando em suas costas. O segundo trabalho exigiu a destruição da Hidra de Lerna, uma cobra aquática com várias cabeças, que estava flagelando os pântanos perto de Lerna. Sempre que Hércules decepava uma cabeça duas cresciam em seu lugar, e, como se isso não fosse um problema suficiente, Hera enviou um caranguejo gigante para morder o pé de Hércules. Este truque desleal foi demais para o herói, que decidiu pedir ajuda a Lo1au; enquanto Hércules cortava as cabeças, lolau cauterizava os locais com uma tocha flamejante, de modo que novas cabeças não pudessem crescer, e finalmente dando cabo do monstro. A seguir, Hércules embebeu a ponta de suas flechas no sangue ou veneno da Hidra, tomando-as venenosas.
No Monte Erimanto, um feroz javali estava se portando violentamente e causando prejuízos. Euristeu rispidamente ordenou a Hércules que trouxesse este animal vivo à sua presença, mas as antigas ilustrações deste episódio, as quais mostram principalmente Euristeu acovardado refugiando-se num grande jarro, sugerem que ele veio a se arrepender desta ordem. Hércules levou um ano para realizar o trabalho a seguir, que era capturar a Corça do Monte Carineu. Este animal parecia ser mais tímido do que perigoso. Este animal era sagrado para a deusa Ártemis e, apesar de ser fêmea, possuía lindas aspas. De acordo com a lenda, Hércules finalmente aprisionou a Corça e a estava levando para Euristeu, encontrou-se com Ártemis, que estava mulo zangada e ameaçou matar Hércules pelo atrevimento em capturar seu animal; mas quando ficou sabendo sobre os trabalhos, ela concordou em deixar Hércules levar o anImal, com a condição que Euristeu o libertasse logo que o tivesse visto.
Os Pássaros Estinfalos eram tão numerosos que estavam destruindo todas as plantações nas vizinhanças do lago Estinfalo em Arcádia; várias fontes dizem que eles eram comedores de homens, ou pelo menos podiam atirar suas penas como se fossem flechas. Não está muito claro como Hércules enfrentou este desafio: uma pintura de um vaso mostra Hércules atacando-os com um tipo de estilingue, mas outras fordes sugerem que ele os abateu com arco e flecha, ou os espantou para longe utilizando um címbalo de bronze feito especialmente para a tarefa pelo deus Hefesto. O último dos seis trabalhos do Peloponeso foi a limpeza dos currais Augianos. O Rei Augias de Élida possuía grandes rebanhos de gado, cujos currais nunca tinham sido limpos, assim o estrume tinha vários metros de profundidade. Euristeu deve ter pensado que a tarefa de limpar os estábulos num único dia seria impossível, mas Hércules uma vez mais conseguiu resolver a situação, desviando o curso de um rio e as águas fizeram todo o trabalho por ele .
Euristeu pede agora que Hércules capture o selvagem e feroz touro de Creta, o primeiro trabalho fora de Peloponeso. Assim que Euristeu viu o animal, Hércules o soltou, este sobrevivendo até ser morto por Teseu em Maratona. A seguir, Euristeu enviou Hércules à Trácia para trazer os cavalos devoradores de homens de Diomedes. Hércules amansou estes animais alimentando-os com seu brutal senhor, e os trouxe de maneira segura a Euristeu. A seguir, ele foi imediatamente mandado, desta vez para as margens do Mar Negro, para buscar a cinta da rainha das Amazonas. Hércules levou um exército junto consigo nesta ocasião, mas nunca precisaria dele se Hera não tivesse criado problemas. Quando chegou à cidade das Amazonas de Temisquira, a rainha das Amazonas estava até feliz que ele levasse sua cinta; Hera, sentindo que estava sendo fácil demais, espalhou um boato que Hércules pretendia levar a própria rainha, iniciando-se uma sangrenta batalha. Hércules, claro, conseguiu escapar com a cinta, mas apenas após duros combates e muitas mortes.
Para realizar seus três últimos trabalhos, Hércules foi completamente fora das fronteiras do mundo grego. Primeiro foi mandado além da borda do Oceano para a distante Eritéia no extremo ocidente, para buscar o Rebanho de Gérião. Gérião era um formidável desafio; não apenas tinha um corpo triplo, mas para ajudá-lo a tomar conta de seu maravilhoso rebanho vermelho também utilizava um feroz pastor chamado Euritão e um cachorro de duas cabeças e rabo de serpente chamado Orto. Orto era o Irmão de Cérbero, o cão que guardava a entrada do Mundo Inferior, e o encontro de Hércules com Gérião é algumas vezes interpretado como seu primeiro encontro com a morte.
Apesar de Hércules ter se livrado de Euritão e Orto sem muita dificuldade, Gérião, com seus três corpos pesadamente armados, provou ser um adversário mais formidável, e apenas após uma terrível luta Hércules conseguiu matá-lo. Quando retomou à Grécia, Euristeu enviou para uma jornada ainda mais desesperadora, descer ao Mundo Inferior e trazer Cérbero, o próprio cão do Inferno. Guiado pelo deus mensageiro Hermes, Hércules desceu ao lúgubre reino dos mortos, e com o consentimento de Hades e Perséfone tomou emprestado o monstro assustador e de três cabeças para mostrá-lo ao aterrorizado Euristeu; Isto feito devolveu o cachorro a seus donos de direito.
Mesmo assim. Euristeu solicitou um último trabalho: que Hércules lhe trouxesse os Pomos do Ouro de Hespérides. Estes pomos, a fonte da eterna juventude dos deuses, cresciam em um jardim nos confins da terra; foram um presente de casamento de Géia, a terra, a Zeus e Hera. A árvore que dava a fruta dourada era cuidada pelas ninfas chamadas Hespérides e guardada por uma serpente. Os relatos variam sobre como Hércules resolveu este trabalho final. As fontes que localizam o jardim abaixo das montanhas Atlas, onde o poderoso Atlas sustenta os céus em suas costas, dizem que Hércules convenceu Atlas a pegar as maças por ele; enquanto fazia esta jornada Hércules sustentou, ele mesmo, o céu; quando Atlas retomou, Hércules teve algumas dificuldades em persuadi-lo a reassumir o seu fardo. Outra versão da estória sugere que o próprio Hércules foi ao jardim lutando e matando a serpente ou conseguindo convencer as Hespérides a lhe entregar as maças. As maças de Hespérides simbolizavam a imortalidade, e este trabalho final significaria que Hércules deveria ascender ao Olimpo, tomando seu lugar entre os deuses.
Além dos doze trabalhas, muitos outros feitos heróicos e aventuras foram atribuídos a Hércules. Na sua busca do jardim das Hespérides, teve que lutar com o deus marinho Nereu para compelir o deus a dar-lhe as informações que necessitava; em outra ocasião enfrentou outra deidade marinha, Tritão. Tradicionalmente foi na Líbia que Hércules encontrou o gigante Anteu: Anteu era filho de Géia, a Terra, e era invulnerável enquanto mantivesse contato físico com sua mãe. Hércules lutou com ele e ergueu-o do solo; desprovido da ajuda de sua mãe, ficou indefeso nos braços poderosos do herói. No Egito Hércules escapou por pouco de ser sacrificado pelas mãos do Rei Busiris. Um adivinho tinha dito a Busiris que o sacrifício de estrangeiros era um método infalível de se lidar com as secas. Como o adivinho era Cipriota, tornou-se a primeira vítima de seu próprio conselho; quando o método se mostrou efetivo, Busiris ordenou que todo o estrangeiro temerário o suficiente a entrar em seu reino seria sacrificado. Na vez de Hércules, deixou-se ser aprisionado e levado ao local do sacrifício antes de se voltar contra seus agressores e matar uma grande quantidade deles.
Hércules não raramente se envolvia em conflito com os deuses. Em uma ocasião, quando não recebeu uma resposta que estava esperando da sacerdotisa do Oráculo de Delfos, tentou fugir com o trípode sagrado, dizendo que iria criar um oráculo melhor por sua própria conta. Quando Apolo tentou detê-lo, ocorreu uma violenta discussão, que foi resolvida apenas quando Zeus arremessou um relâmpago entre eles. Hércules era mulo leal aos seus amigos; mais do que uma vez ele arriscou sua vida para ajuda-los, sendo o caso mais espetacular o de Alceste. Admeto, Rei de Feres na Tessália, tinha feito um acordo com Apolo que, quando chegasse a hora de sua morte, poderia continuar a viver se encontrasse alguém que quisesse morrer em seu lugar. Entretanto, quando Admeto estava se aproximando da hora da sua morte, mostrou-se ser mais difícil do que tinha calculado arranjar um substituto; após seus parentes mais velhos terem egoisticamente se recusando ao sacrifício, sua esposa Alceste insistiu para que fosse a sacrificada. Quando Hércules chegou, ela já tinha descido ao Mundo Inferior, indo ele imediatamente atrás dela. Então lutou com a morte e venceu, trazendo-a de volta em triunfo ao mundo dos vivos.
Hércules era o super-homem grego, sendo muitas das estórias de seus feitos interessantes, contos de realizações sobre-humanas e monstros fabulosos. Ao mesmo tempo Hércules, assim como Ulisses, também atua como se fosse um homem comum, sendo suas aventuras como parábolas exageradas da experiência humana. Irritadiço, não extremamente inteligente, apreciador do vinho e das mulheres (suas aventuras amorosas são muito numerosas), era uma figura eminentemente simpática; e no geral seu exemplo deveria ser seguido, pois destruía o mal e defendia o bem, superando todos os obstáculos que o destino lhe colocou. Além de tudo, ofereceu alguma esperança para a derrota da ameaça última e crucial do homem, a morte.
O fim de Hércules foi caracteristicamente dramático. Uma vez, quando ele e sua nova noiva Dejanira estavam atravessando um rio, o centauro Nesso ofereceu-se para transportar Dejanira, e no meio da correnteza tentou rapta-la. Hércules matou-o com uma de suas flechas envenenadas, e ao morrer, Nesso simulando arrependimento, incentivou Dejanira a pegar um pouco de sangue do seu ferimento e guarda-lo; se Hércules algum dia parecesse cansado dela, deveria embeber um traje no sangue e dá-lo para que ele o vestisse; após isso, ele nunca mais olharia para outra mulher. Anos mais tarde Dejanira lembrou-se deste conselho quando Hércules, voltando de uma distante campanha, mandou à frente uma linda princesa aprisionada pela qual estava evidentemente apaixonado. Dejanira mandou a seu marido um robe tingido pelo sangue; ao vestir a roupa, o veneno da Hidra penetrou na sua pele e ele tombou em terríve1 agonia. Seu filho mais velho, Hilo, levou-o ao Monte Ela e depositou seu corpo, retorcido, porém ainda respirando, numa pira funerária, a qual acabou sendo acesa pelo herói Filoctetes. Entretanto, os trabal1os de Hércules asseguraram-lhe a imortalidade, assim ele subiu ao Olimpo e assumiu seu lugar entre os deuses que vivem eternamente.
Marte
Tipo e Atributos de Marte
Marte (Ares, deus sanguinário e detestado pelos imortais) nunca teve grande importância entre as populações helênicas. Em numerosas localidades, parece até haver sido inteiramente desconhecido, e se o seu culto conservou na Lacônia importância maior que alhures, deve-se à rudeza dos habitantes de tal país. Foi somente entre os romanos que Marte adquiriu importância verdadeira, e permanente; o tipo de Palas conformava-se muito mais ao gênio grego. Com efeito, Palas é a inteligência guerreira, ao passo que Marte nada mais é do que a personificação da carnificina. Ávido de matar, pouco lhe importa saber de que lado está a justiça e cuida apenas de tomar mais furiosa a luta. O deus da guerra e da violência aparece-nos sempre em atitude de repouso. Tem, por vezes numa das mãos a Vitória como Júpiter ou Minerva. Vemo-lo com tal aspecto numa famosa estátua da Villa Albani. Uma linda pedra gravada mostra Marte segurando com uma das mãos a Vitória e com a outra a oliveira, símbolo da paz proporcionada pela vitória.
A maioria das vezes usa um capacete e empunha uma lança ou gládio. Aparece, assim, em várias medalhas, mas as estátuas que o representam isoladamente não são demasiadamente comuns entre os gregos. Entretanto a bela estátua do Louvre conhecida pelo nome de Aquiles Borgbese passa hoje por ser um Marte. Explica-se o elo que usa num dos pés pelo hábito de certos povos, e notadamente os lacedemônios, de agrilhoarem o deus da guerra.
Parece ter sido o escultor Alcameno de Atenas quem fixou o tipo de Marte, tal qual surge habitualmente nos monumentos artísticos. Os atributos habituais do deus são o lobo, o escudo e a lança com alguns troféus. Uma medalha cunhada na época de Seotímio Severo nos mostra Marte com uma lança, um escudo e uma escada para o ataque. Sob tal aspecto, Marte recebe o epíteto de Teichosipletes (que sacode as muralhas). Em geral, porém. não tem real importância na arte a não ser pela sua ligação com Vênus.
Num célebre quadro da galeria de Florença, Rubens representou Marte, que Vênus e Cupido se esforçam inutilmente por reter, e que, de gládio empunhado, segue a Discórdia precedida do Temor e do Espanto. As Artes chorosas, a Música, a Arquitetura e a Pintura, são pisadas pelo feroz deus; o comércio está destruído e os campos prestes a ser incendiados. Noutro quadro do mesmo pintor, vemos, ao contrário, Marte repelido por Minerva, enquanto a Terra oferece o seio fecundo do qual o leite jorra ao lado de um grupo de crianças que acorrem a ver uma cornucópia que lhes oferece Pã, o deus da agricultura.
Marte na Guerra dos Gigantes
Claudiano descreveu o papel de Marte na guerra dos Gigantes:
“O deus impele os seus furiosos corcéis contra a borda formidável e, imprimindo ao gládio um movimento irresistível, o monstruoso Peloro é atingido no ponto em que, por um estranho acoplamento, duas serpentes se lhe unem ao corpo que elas sustentam. Marte vendo-o tombar, faz passar as rodas do carro sobre o inimigo vencido, e o sangue que jorra desse corpo enorme avermelha as montanhas vizinhas”.
Entretanto, Peloro tinha um irmão, o gigante Mimas, que, ocupado em lutar noutra região viu Peloro cair. Mimas pensa exclusivamente na vingança e curvando-se para o mar, quer dele arrancar a ilha de Lemnos para atira-la contra o deus. Marte evita o choque e com um golpe de lança fura a cabeça de Mimas, cujo cérebro se esparrama à direita e à esquerda.
Marte foi menos feliz com outros Gigantes. Fora aprisionado por Oto e Efialtes que o haviam mantido agrilhoado durante treze meses. O escultor Flaxman nos mostra o deus da guerra em posição humilhante. Oto e Efialtes tinham tentado escalar o céu colocando o monte Ossa sobre o Olimpo e o Pélion sobre o Ossa. Diana, para evitar-lhes a perseguição, viu-se obrigada a transformar-se em corça e estando a fugir precipitadamente, os dois irmãos Gigantes, que vinham um em cada direção, atiraram contra ela ao mesmo tempo os seus dardos, e dessa maneira, mataram um ao Outro. (Apolodoro).
Vênus e Marte
A aliança entre a guerra e o amor, entre a força e a beleza, é uma ideia inteiramente conforme ao espírito grego. Apesar de brutalíssimo, não pôde Marte resistir a Vênus que o subjuga e domina com um sinal: da união de Marte e Vênus nasceu Harmonia. Vários monumentos antigos, notadamente o famoso grupo do museu de Florença e o do museu Capitolino, reproduzem essa ligação que também se vê em pedras gravadas.
Os romanos gostavam de fazer-se representar com suas mulheres, e usando os atributos de Marte e Vênus; era uma alusão à coragem do homem e à beleza da mulher.
Aliás, os romanos consideravam Marte e Vênus autores de sua raça, e durante a época imperial, dava-se frequentemente aos deuses a feição dos imperadores. Assim é que temos no Louvre um grupo cuja personagem masculina parece ser Adriano ou Marco Aurélio, e que representa Marte ao lado de Vênus. Mas a imperatriz está vestida. Vários arqueólogos pensam que a Vênus de Milo estava ao lado da estátua de Marte. A arte dos últimos séculos ligou igualmente as duas divindades e num encantador quadro do Louvre, le Poussin nos mostra o deus da guerra esquecido dos seus atributos e do seu papel sorrindo para a deusa, enquanto os cupidos brincam tranquilamente com as armas, no meio de risonha paisagem.
Marte Ferido por Diomedes
Marte, na guerra de Tróia, acirrado inimigo dos gregos, foi ferido por Diomedes e deu um grito semelhante ao clamor de dez mil combatentes numa furiosa batalha. Subiu ao Olimpo para dar vazão à suas queixas contra o herói grego e, sobretudo, contra Minerva que dirigira o golpe. Tens por tua filha, diz a Júpiter uma indigna fraqueza, porque tu sozinho foste quem gerou tão funesta divindade. Ei-la agora que excita contra os deuses o insensato furor de Diomedes. Ousado! Em primeiro lugar feriu Vênus na mão, depois atirou-se a mim e se os meus pés velozes não me houvessem subtraído à sua cólera, lá teria ficado ou estendido sem força aos golpes do ferro.
Júpiter acolhe mal as queixas de. Marte:
Divindade inconstante, exclama, cessa de importunar-me com os teus lamentos! De todos os habitantes do Olimpo, tu és o que eu mais odeio, pois só amas a discórdia, a guerra, a carnificina. Tens, sem dúvida o intratável caráter de tua mãe Juno, que as minhas ordens soberanas mal conseguem domar. Os males que suportas hoje, são o fruto dos seus conselhos. Mas não quero que sofras por mais tempo visto que sou teu pai.
O rei dos deuses manda então, que se cure o filho e um bálsamo salutar lhe acalma as dores, porque os deuses não podem morrer. Um interessante quadro da mocidade de Davi, que obteve o segundo prêmio em 1771 mostra Diomedes no momento em que acaba de lançar contra Marte o dardo dirigido por Minerva. Marte, ferido, está caído. O quadrinho é valioso porque nos dá a conhecer Davi numa época em que o jovem artista não pensava absolutamente na reforma que, posteriormente, introduziu na pintura, e em que todo o seu talento estava impregnado do estilo dominante então na escola francesa.
Filomela e Progne
O caráter feroz das lendas concernentes a Marte mais ainda se exagera quando elas se aplicam a seus filhos. Tivera ele de uma ninfa um filho chamado Tereu, rei da Trácia, que desposou Progne, filha do rei de Atenas Pandião. Tinha esta outra filha chamada Filomela. Progne exprimiu ao marido o desejo de rever a irmã da qual se achava separada havia cinco anos. Tereu foi, então, a Atenas procurar Filomela, mas no caminho abusou dela, e, após lhe arrancar a língua para obriga-la ao silêncio, encerrou-a muna torre. Disse, em seguida, a Progne que sua irmã morrera; mas Filomela da masmorra descobriu um modo de mandar à irmã num pedaço de tela a narração das suas aventuras.
Progne, com o auxílio das festas de Baco, conseguiu libertar Filomela, e ocultou-a num canto do palácio. Juntas, meditam clamorosa vingança. Tereu tinha um filho muito moço chamado Itis; chamam-no, matam-no, e cozem-lhe os membros que, de noite, Progne oferece ao marido. Tereu pergunta porque o filho não está à mesa, mas só quando termina o repasto é que Filomela, saindo subitamente do esconderijo, lhe anuncia que comeu a carne do próprio filho e, ao mesmo tempo, para que ele não duvide do que lhe afirma lhe atira ao rosto a cabeça do infeliz rapaz. Tereu, não se contendo, quer levantar-se para estrangular as duas irmãs, mas os deuses desejosos de pôr cobro a tão horrível família metamorfoseiam Progne em andorinha, Filomela em rouxinol, Itis em pintassilgo e Tereu em pomba. A bárbara história ministrou a Rubens tema para um quadro que está na Espanha; vemos Progne e Filomela mostrando a Tereu a cabeça do filho cuja carne ele acaba de comer.
Os Sacerdotes Sálios
O culto de Marte tinha grande importância em Roma. Era exercido pelos sacerdotes sálios, instituídos por Numa para guardarem os ancilos. Os ancilos tinham sido feitos em Roma sobre o modelo de um escudo caído do céu, durante uma peste que dizimava a cidade, e era considerado o palácio romano. Durante certas festas os sacerdotes sálios percorriam a cidade levando a passeio os ancilos cuja forma nos foi conservada num denário de prata cunhado sob Augusto. O barrete que está no meio é o ápex do flâmine.
Belona
A companheira habitual de Marte é Belona (Enio), personificação da chacina. Tinha ela por missão especial conduzir o Carro do deus da guerra e excitar-lhe os cavalos com a ponta de uma lança. As figuras antigas de Belona são extremamente raras. Plínio narra que Apeles pintara um quadro representando Belona, de mãos atadas atrás das costas e presa ao carro triunfante de Alexandre: o quadro fora levado para Roma como troféu.
A Discórdia
Nos poetas, Belona é escoltada pelo Espanto, pela Fuga e pela Discórdia, divindades às quais a arte não destinou tipo particular. Contudo, tem a Discórdia grande importância na miologia, pois foi ela que causou a ruína de Tróia atirando a maçã de ouro entre as deusas. Homero faz da Discórdia o retrato seguinte:
Deusa que, fraca no nascimento, cresce e em breve oculta a cabeça no céu, enquanto os pés lhe permanecem na Terra; é ela que, atravessando a multidão dos guerreiros derrama em todos os corações o ódio fatal, precursor da carnificina. Faz retumbar a voz, dá gritos alucinantes, terríveis, e lança no coração de todos os guerreiros impressionante coragem. Apraz-se em ouvir os gemidos do soldado que morre e, quando todos os deuses se retiram do combate, é a única que permanece no campo de batalha para dar, como pasto aos olhos, o espetáculo dos mortos e dos moribundos.
Etéoclo e Polinice
A Discórdia preside a disputas que dividem os povos e as famílias. A Fábula de Etéoclo e Polinice nos mostra a sua ação. Os dois filhos de Édipo haviam expulsado o pai, que cobriu de maldições e lhes predisse que se matariam um ao outro. Os dois irmãos, temendo que a maldição paterna fosse ratificada pelos deuses, se continuassem a viver juntos, decidiram, de comum acordo, que Polinice seria o primeiro em se exilar voluntariamente da pátria, que deixaria o cetro a Etéoclo, e voltaria depois, para que cada um pudesse reinar, alternadamente, um ano. Mas Etéoclo, uma vez no trono, recusou-se a descer e proibiu ao irmão o regresso à pátria. Polinice, então, tratou de procurar aliados para a defesa dos seus direitos.
Anfiaraus
Adrasto, rei de Argos, acolheu Polinice, e prometeu-lhe repô-lo no trono de Tebas. Buscou, por conseguinte aliados para empreender a luta, mas um poderoso chefe, Anfiaraus, tratou de dissuadir ambos por ser adivinho, e por lhe haver a ciência mostrado, que a. guerra seria fatal aos que a começassem, e que todos morreriam, com exceção apenas de Adrasto. Anfiaraus tinha uma mulher chamada Erifila, e por um velho juramento que fizera a Adrasto, comprometera-se, no caso de divergências entre eles, a submeter-se inteiramente à decisão de Erifila. Quando Polinice soube disso, empregou um ardil para forçar Anfiaraus a combater. Tinha em suas mãos o famoso colar que Vênus dera, noutros tempos, à Harmonia, no dia de suas núpcias com Cadmo. Deu-o de presente a Erifila que, assim, se deixou corromper, e Anfiaraus, apesar da certeza que tinha de mau êxito do negócio, foi obrigado a combater com Adrasto e Polinice. Um poderoso exército se reuniu em breve para marchar contra Tebas. Comandavam-no sete chefes: Adrasto, Polinice, Capaneu, Partenopeu, Anfiaraus, Hipomedonte e Tideu. Juraram todos que iriam combater sob as suas ordens.
Arquemoro
Durante o caminho, faltou-lhes água, e o exército começou a sofrer devoradora sede. Encontraram então uma criatura que tinha um filhinho, e perguntaram-lhe se não havia no país uma fonte. Chamava-se o menino Ofeltes e era filho do rei Neméia. A mulher era Hipsipila, outrora rainha de Lemnos, mas que, tendo sido vendida posteriormente como escrava, estava ao serviço do rei de Neméia que lhe confiara a tutela do filho. Hipsipila pousou a criança sobre umas folhas de aipo e conduziu os sete chefes a uma fonte das proximidades. Durante a curta ausência, porém, uma serpente envolveu nas espiras a criança abandonada e sufocou-a. Ao regressarem os chefes apressaram-se em matar a serpente e tomaram aos seus cuidados Hipsipila, para livra-la da ira do rei de Neméia. Deram à criança o nome de Arquemoro, realizaram-lhe um magnífico funeral e instituíam em sua honra os jogos de Neméia nos quais os vencedores se cobriam de luto e se coroavam de aipo.
Combate dos Dois Irmãos
Anfiaraus viu naquilo péssimo presságio. Mas era preciso partir, e assim chegaram todos a Tebas. Uma terrível batalha se feriu sob os muros da cidade, que Etéoclo não pretendia entregar. Como o sangue escorresse por toda parte, Etéoclo subiu a uma torre, mandou que se fizesse silêncio, e disse aos exércitos:
Generais da Grécia, chefes dos argivos que a guerra atrai para estes páramos, e vós, povo de Cadmo, não arrisqueis mais a vida nem por Polinice, nem por mim. Quero eu, sozinho, enfrentar o perigo, e desejo lutar contra meu irmão, de homem para homem. Se o matar, governarei sozinho, se for vencido, entregar-Ihe-ei a cidade. Vós, portanto, abandonai o combate, voltai para Argos, não venhais mais aqui perder a vida; o povo tebano não deseja outras mortes. (Eurípedes).
Feriu-se, então, entre os dois irmãos um combate singular no qual foram mortos ambos. Os deuses haviam ouvido as derradeiras imprecações de Édipo. Esse combate figura num grandíssimo número de baixos-relevos antigos. O exército sitiante foi vencido, e todos os chefes pereceram com exceção de Adrasto, que deveu a vida à rapidez do seu cavalo. Assim, realizou-se a profecia de Anfiaraus.
Funerais de Etéoclo e de Polinice
O senado de Tebas, que tomara partido pelos sitiados, decidiu que Etéoclo seria sepultado com honra, mas que seu irmão Polinice seria, em virtude da traição, deixado sem sepultura para que o devorassem os cães e os abutres. Antígona quis enterrar o irmão, apesar das ordens dadas e, decidida a desobedecer, disse aos chefes do povo:
Pois bem! Eis o que respondo eu aos chefes dos de Cadmos. Se não há quem queira, comigo, enterra-lo, hei de conseguir sozinha, e assumirei toda a responsabilidade. Não vejo vergonha nenhuma em sepultar meu irmão, nem que para isso devesse, rebelada, ir de encontro aos desejos da cidade. É coisa grave termos caído das mesmas entranhas, termos tido a mesma mãe, uma infeliz, o mesmo pai, outro infeliz. Sim, deliberadamente, hei de continuar irmã deste morto. Ah, não se fartarão da sua carne os lobos de ventre faminto. Hei de sozinha, apesar de mulher, incumbir-me de remover a terra e preparar uma cova. Trarei o pó nas dobras desta tela, e eu pr6pria a recobrirei com ele o cadáver. Ninguém objetará! Terei essa coragem, e, o que é mais, terei ao meu lado todos os recursos de uma alma que quer conseguir. (Ésquilo).
Pausânias, na narração das suas viagens, diz que viu o túmulo dos filhos de Édipo.
Não assisti aos sacrifícios que ali se realizam, mas pessoas dignas de fé me asseguraram que nas ocasiões em que se assam as vítimas imoladas aos dois irmãos irreconciliáveis, a chama e a fumaça se dividem visivelmente por eles.
Creonte, rei de Tebas, sabendo que, não obstante a proibição, Antígona sepultara o irmão, pergunta-lhe se conhecia o decreto. A jovem não nega:
Não pensei, responde, que as leis dos mortais tivessem bastante força para superar as leis não escritas, obra imutável dos deuses. Para mim, o traspasse não tem nada de doloroso, mas se tivesse deixado sem sepultura o filho de minha mãe, teria sido infeliz; quanto à morte que me aguarda em nada me assusta.
Creonte, conformando-se à lei, ordenou a morte de Antígona e as suas ordens foram executadas; ao mesmo tempo, porém, soube da morte de seu filho único Hemon, que amava Antígona, e que se ferira mortalmente. Sua mulher morreu também ao saber da morte do filho, e Creonte ficou sozinho com toda a amargura. Assim terminou, a família de Laio.
Minerva
Minerva e Encéades
Minerva participou da guerra dos deuses contra os gigantes e contribuiu poderosamente para a vitória de Júpiter. Entre os inimigos por ela vencidos, o mais importante é Encéades. A força desse gigante era tal que, sozinho, poderia ter lutado contra todos os deuses juntos. Num momento em que Minerva se achava distante dos companheiros de armas, Encéades percebendo que ela estava sozinha, dá um salto e posta-se-lhe na frente. A deusa sem empalidecer reúne todas as forças e pegando com ambas as mãos a SicHia, atira-a sobre o gigante que fica esmagado sob a enorme massa. A queda de Encéades termina a guerra dos gigantes: às vezes tenta ele remexer-se, e é o que produz os tremores de terra da região. A sua cabeça está situada sob o monte Etna, por onde vomita chamas. O tanque de Encéades em Versalhes mostra o gigante do qual somente vemos a cabeça e os gigantescos braços no meio dos fragmentos de rochedos. Mas a luta de Minerva contra esse gigante, tal qual a descreveu a mitologia, tem sido raramente representada, por não ser do domínio público.
Minerva e Tiréias
Virgem essencialmente casta, Minerva sempre vestida, e se os artistas dos últimos séculos a representam por vezes despida, notadamente no julgamento de Pais, é pela ignorância em que se encontram quase sempre dos caracteres distintivos da deusa. Um único homem, o tebano Teréias, observou um dia Minerva no banho, e foi imediatamente ferido de cegueira, ou, segundo outros, metamorfoseado em mulher.
A Estória de Ulisses
Ulisses (também chamado de Odisseu) sabia antes de ir a Tróia que decorreriam vinte anos para o seu retorno à sua ilha rochosa de Ítaca, seu filho Telêmaco e sua esposa Penélope. Permaneceu em Tróia por dez anos e por outros dez singrou os oceanos, naufragou, acabando por ficar desprovido de todos os seus companheiros, frequentemente com a vida por um fio, até que no vigésimo ano chegou mais uma vez às praias de sua ilha natal.
O Ciclope
Ao deixar Tróia, Ulisses e seus companheiros primeiramente encontraram os Cicônios, cuja cidade eles saquearam, mas em cujas mãos sofreram pesadas baixas. Estiveram em perigo de perder mais elementos para os Comedores de Loto, hedonistas que nada faziam além de ficarem sentados e comendo as saborosas frutas que os faziam esquecer todos os cuidados e responsabilidades. Ulisses teve que arrastar a força de volta ao navio aqueles que, entre os seus homens, provaram o loto. Mal tinham se recobrado da aventura quando enfrentaram a seguinte, o encontro com o Ciclope Polifemo.
Os ciclopes eram uma raça de fortes gigantes de um só olho que ocupavam uma fértil região onde o solo gerava abundantes plantações por conta própria, fornecendo um pasto farto para as gordas ovelhas e bodes. Ansioso para encontrar os habitantes de tal terra, Ulisses direcionou um navio para o porto e, desembarcando, se dirigiu juntamente com a tripulação à caverna do Ciclope Polifemo, um filho de Possídon. Polifemo estava fora cuidando de suas ovelhas, assim Ulisses e a tripulação ficaram à vontade, até que ele retornou com o seu rebanho ao crepúsculo.
O Ciclope era forte. monstruoso e terrível e após algumas poucas perguntas sobre a origem e o que desejavam seus hóspedes inesperados, agarrou dois deles e fez seus miolos saltarem ao chão antes de devora-los. A seguir o Ciclope sentiu-se sonolento; Ulisses considerou esfaqueá-lo até a morte, mas desistiu da ideia quando percebeu que a fuga seria impossível, pois a entrada da caverna tinha sido bloqueada com uma grande rocha, a qual o Ciclope podia erguer com uma só mão, mas seria impossível de mover mesmo com a força combinada de Ulisses e seus companheiros. O Ciclope comeu mais dois homens de Ulisses como refeição matinal e então saiu, tomando o cuidado de recolocar a grande pedra na entrada da caverna. O inteligente Ulisses não demorou a montar um plano de ação. Ele aguçou a ponta de uma grande estaca de madeira que havia no chão da caverna e endureceu sua ponta ao fogo.
Ao cair da tarde quando Polifemo retomou à caverna, Ulisses ofereceu-lhe uma tigela de forte vinho para acompanhar sua ração de marinheiros gregos. O Ciclope bebeu o vinho com entusiasmo e pediu para que a tigela fosse reenchida três vezes. Então, num estupor de embriaguez, deitou-se para dormir. Antes de dormir, perguntou o nome de seu hóspede, e Ulisses respondeu que era. Outis, ou seja, ninguém em grego; o Ciclope prometeu que em retribuição pelo vinho comeria ninguém por último. Assim que o monstro dormiu, Ulisses aqueceu a ponta da estaca ao fogo; quando ela ficou em brasa ele e quatro de seus melhores homens enterraram a ponta no olho único do Ciclope.
O olho emitiu um chiado, semelhante o alto silvo que sai de um grande machado ou enxó quando o ferreiro coloca a peça dentro da água para conferir-lhes têmpera e dar força ao ferro. O Ciclope, rudemente acordado pela dor terrível, urrou e rugiu, chamando seus vizinhos, os outros Ciclopes, para que viessem ajuda-lo. Mas quando estes se agruparam do lado de fora de sua caverna e perguntaram quem o estava incomodando, quem o tinha ferido, sua única resposta foi que ninguém o incomodava e ninguém o estava ferindo; assim eles acabaram perdendo o interesse e se retiraram.
Ao amanhecer, Ulisses e seus homens se preparam para fugir da caverna; cada homem foi amarrado embaixo de três grandes ovelhas, enquanto Ulisses alojou-se sob o líder do rebanho, um grande carneiro com magnífica lã. O Ciclope cego afastou a pedra e sentou-se à entrada da caverna, tentando agarrar a tripulação de Ulisses que estava saindo juntamente com as ovelhas, mas estes passaram a salvo por suas mãos, Ulisses por último. Guiando as ovelhas para o seu navio, eles trataram de zarpar rapidamente, apesar que Ulisses não resistiu zombar do Ciclope, que respondeu atirando pedaços de penhascos na direção de sua voz, alguns chegando a cair mulo próximos do barco. Assim, Ulisses reuniu-se ao restante da esquadra e, enquanto os marinheiros pranteavam os companheiros perdidos, consolaram-se com as próprias ovelhas que tinham auxiliado sua fuga da caverna.
Eólia
Da ilha do Ciclope, Ulisses velejou até que chegou à ilha flutuante de Eólia, cujo rei, Éolo, tinha recebido de Zeus o poder sobre todos os ventos. Éolo e sua grande família receberam Ulisses e sua tripulação de maneira hospitaleira, e, ao chegar a hora da partida, Éolo deu a Ulisses uma bolsa de couro na qual tinha aprisionado todos os ventos tempestuosos; a seguir invocou uma boa brisa para o oeste que levaria os navios a salvo para casa, em Ítaca. Eles velejaram no curso por dez dias e estavam à vista de Ítaca quando o desastre os atingiu. Ulisses, que tinha ficado acordado toda a jornada segurando o leme do barco, caiu num sono exausto, e sua tripulação não sabendo o que havia na bolsa de couro, começou a suspeitar que continha um valioso tesouro que Éolo teria dado a Ulisses.
Ficaram enciumados, sentindo que tinham enfrentado as situações difíceis com Ulisses, devendo também compartilhar suas recompensas: acabaram por abrir a bolsa e acidentalmente libertaram os ventos. Ulisses acordou no meio de uma medonha tempestade, que soprou o navio de volta a Eólia. Desta vez a recepção dada a Ulisses e a seus companheiros foi bastante diferente. Eles pediram que Éolo lhes desse uma nova chance, mas, este declarando que Ulisses devia ser um homem odiado pelos deuses, negou-se terminantemente a ajuda-los, mandando embora Ulisses e seus companheiros.
Circe
Na sua seguinte chegada à terra, Lestrigônia, todos os navios, com exceção o de Ulisses, foram perdidos num calamitoso encontro com os monstruosos habitantes; assim foi num estado considerável de pesar e depressão que Ulisses e seus camaradas sobreviventes viram-se na ilha de Aca. Desembarcando, permaneceram deitados dois dias e duas noites na praia, completamente exaustos pelos seus esforços e desmoralizados pelos horrores que tinham passado. No terceiro dia, Ulisses levantou-se para explorar a ilha, e a partir de um outeiro percebeu fumaça saindo de uma habitação na floresta. Decidindo prudentemente a não fazer um reconhecimento imediato, retomou ao barco para contar a novidade aos companheiros. Previsivelmente ficaram amedrontados, lembrando dos Lestrigões e do Ciclope, mas, como Ulisses estava determinado a explorar, dividiu sua companhia em dois grupos, um comandado por ele próprio e o outro por um homem chamado Euriloco.
Os dois grupos tinham a sorte e a tarefa da exploração recaiu em Euriloco, enquanto Ulisses permaneceu no navio. O grupo de Euriloco acabou chegando à casa na floresta. Do lado de fora existiam lobos e leões, que cabriolavam e faziam festas aos homens; eram de fato seres humanos que tinham sido transformados em animais pela feiticeira Circe, cujo lindo canto podia ser escutado no interior da casa. Quando os marinheiros gritaram para chamar sua atenção, saiu e os convidou a entrar; apenas Euriloco, suspeitando de algum truque, permaneceu do lado de fora. Circe ofereceu comida aos homens, no qual continha uma droga que os faria esquecer de sua terra natal; quando terminaram de comer, os tocou com sua varinha e os conduziu ao chiqueiro, pois agora possuíam a forma externa de porcos, apesar de infelizmente lembrarem quem realmente eram.
Em pânico, Euriloco voltou correndo ao navio para relatar o desaparecimento de seus companheiros. Ulisses ordenou que o levasse de volta à casa de Circe, e quando se recusou, partiu só para o resgate. No seu caminho através da ilha, encontrou Hermes, disfarçado como um jovem; o deus deu-lhe uma planta mágica, a qual, misturada com a comida de Circe, seria um antídoto para sua droga; também o instruiu como lidar com a feiticeira: quando Circe o tocasse com sua varinha, deveria avançar sobre ela como se para matá-la; ela então recuaria com medo e o convidaria a compartilhar de sua cama. Deveria concordar com isso, mas deveria faze-la jurar solenemente a não tentar truques enquanto estivesse vulnerável.
Os fatos se passaram como Hermes tinha previsto. Após terem ido para a cama, Circe banhou Ulisses e o vestiu com roupas finas e lhe preparou um suntuoso banquete, mas Ulisses sentou-se numa abstração silenciosa, recusando toda a atenção. Circe acabou lhe perguntando o que estava errado, e disse-lhe que ela não poderia esperar que estivesse de corpo e alma na festa enquanto metade de sua tripulação estava chafurdando no chiqueiro. Então Circe libertou os novos porcos de seu confinamento e os untou com unguento mágico. Seus pelos rijos caíram e se tornaram novamente homens, porém mais jovens e mais bonitos do que tinham sido antes. Ulisses e seus homens choraram com alívio e alegria e pararam apenas quando Circe sugeriu que deveriam chamar o restante de sua companhia para que se juntassem à celebração. Ficaram com Circe por todo um ano, comendo, bebendo e se divertindo, esquecendo os percalços que tinham passado.
Circe II
Livro “Poções Mágicas” de Gerina Dunwich.
Dizem que Circe era uma linda feiticeira loura e filha de Hécate, a Deusa grega protetora de todas as bruxas e das artes mágicas. (No entanto outras fontes a colocam como filha do Deus Sol e de sua consorte Perse). Ela residia num palácio que ficava em uma ilha encantada chamada Aeaea (que significa lamento), e era de lá que irradiava o seu canto mavioso. Dizem ainda que ela transformou todos os companheiros de Odisseu em porcos, fazendo uso de uma fortíssima poção produzida com o sumo da mandrágora, a planta mágica mais venenosa de que se tem notícia (embora a receita exata ainda nos seja desconhecida).
Odisseu era um protegido de Hermes e deste havia recebido uma erva chama mole, para se proteger dos poderes de Circe e resguardar-se da agonia de se ver transformado em um animal de 4 patas, bufão e barulhento. (Apesar de não saber até hoje o que era na verdade a tal mole, alguns pesquisadores já sugeriram que o amuleto de ervas ostentado por Odisseu era feito com alho silvestre). Assim, empunhando a espada em uma das mãos e carregando na outra os poderes de proteção da erva que Hermes havia lhe dado, Odisseu exigiu que Circe devolvesse a forma humana aos seus companheiros. E o fato é que ela obedeceu e ainda por cima lhes ofereceu honrarias e prazeres.
Circe (Grécia): “Falcão Fêmea”; deusa da Lua Nova; tecelã do destino.
Chamada de a ave-da-morte (kirkos ou falcão). Como o círculo, ela era a tecelã dos destinos. Antigos escritores gregos citavam-na como Circe das Madeixas Trançadas, pois podia manipular as forças de criação e destruição através de nós e tranças de seus cabelos. A ilha de Aeaea era um santuário funeral para ela; diz-se que seu nome vem do grito de angústia. Era a deusa do amor físico, feitiçaria, encantamentos, sonhos precognitivos, maldições, vingança, magia, bruxaria, caldeirões.
Scath
Os nomes pelos quais esta deusa é mais conhecida são: Scathach, Scota, Scatha e Scath. É cultuada na Irlanda e na Escócia como sendo “The Shadowy One” (A Sombria) e “She who strikes the fear” (Aquela que detona o medo). Deusa do Mundo Inferior e senhora da Terra de Scath, representa a Deusa em seu aspecto destruidor. Tem domínio sobre a cura, a profecia e é a padroeira dos ferreiros e das artes marciais. É associada à Lua Negra (Lilith), tempo de escuridão (Lua Nova) no céu.
Conta a lenda que Scath era uma guerreira e profetisa que viveu em Albion, na Escócia, na Ilha de Skye – a ilha em forma de pássaro – e que era mestra de artes marciais. Teria ensinado estas artes a Cuchulainn, de quem também teria sido amante, assim como sua irmã Uathach (conhecida como “A Verdadeiramente Terrível”). Os ferreiros eram tidos em alta conta na estrutura social celta, pois ao serem enviados por um ano e um dia para aprender a arte da forja de armas variadas na Ilha de Skye, também aprendiam com Scath a encantar estas armas e torná-las imbatíveis, além de aprenderem a magia da cura e da profecia.
Scath é descrita como sendo guerreira e sedutora, de cabelos vermelhos, sensual como a mistura de couro e cordões, seda e metal. Alguns estudiosos da mitologia nórdica consideram que Scath seria Skadi, a irmã gêmea de Freyja em seu “lado escuro”, ou seja, a Deusa da Morte que cuidaria das almas recolhidas por sua irmã Freyja nos campos de batalha. Mas há muitas controvérsias sobre esta associação, apesar da coincidência entre ambas terem uma irmã “terrível” e serem mestras e amantes dos grandes guerreiros de cada uma das mitologias (celta e nórdica).
O Fio de Ariadne – Um Caminho para a Luz
Texto de C.C.A da Loja Cavaleiros do Hermon 335
O labirinto no qual tantas vezes o ser humano se vê enredado obedece à falta de conhecimentos sobre as causas que o levaram às difíceis situações da vida e a falta de uma adequada capacitação no sentido de solucioná-las. Os problemas de toda índole que se sucedem – profissionais, familiares, econômicos, espirituais – se por um lado configuram a prova ou o obstáculo a ser transposto; por outro, além de se constituir martírios intermináveis, induzem o indivíduo a refletir que não possui as condições necessárias para transpô-los; o fio condutor que o livrasse do labirinto em que se encontra.
Na mitologia grega, a bela Ariadne salva o herói Teseu, preso no Labirinto, depois de ter aniquilado o terrível Minotauro, dando-lhe um fio que lhe permitisse encontrar o caminho de volta para a luz, para fora da obscuridade terrível em que se encontrava. As obscuridades dos pensamentos-problema diversos que o homem vive têm uma estreita relação com o Labirinto, o palácio do rei Minos da ilha de Creta, exuberante e portentosa construção da qual ninguém conseguia sair sem o guia que conhecesse a fundo aqueles meandros.
O Minotauro, meio-homem, meio-fera, era o devorador daqueles que se perdiam nos tortuosos caminhos da maravilhosa construção. O fio de Ariadne representa o auxílio salvador, o caminho para a luz. Infelizmente, o ser humano tem esperado que outros resolvam os seus problemas sem atinar que o fio condutor, o caminho para a luz, pudesse estar nele mesmo, em sua natureza inteligente, sensível e espiritual. Isso não significa que não necessite da ajuda e da orientação de quem, como o guia, pudesse lhe mostrar o caminho a percorrer para salvar-se do destino terrível dos que sucumbem ao enfrentar o homem-fera que carregam dentro de si.
O fio de Ariadne – o conhecimento do caminho de volta da obscuridade para a luz – é acessível a toda a alma humana que aspire, firmemente, despojar-se de velhas ideias e preconceitos seculares, para iniciar-se nos caminhos da evolução e do aperfeiçoamento individual.
O Mundo Inferior
Eventualmente, Ulisses foi lembrado por alguns dos companheiros que talvez fosse tempo de se pensar em Ítaca. Circe avisou-o que antes de zarpar para casa deveria primeiro visitar o Mundo Inferior (ou reino dos mortos) para consultar o profeta tebano Tirésias: apenas Tirésias poderia dar-lhe instruções para seu retomo. Assim, Ulisses velejou com seu navio através do Rio de Oceano e atracou o barco perto do bosque de choupos de Perséfone. Lá na margem, cavou uma vala na qual colocou libações aos mortos, compostas de mel, água, leite e vinho; sobre a vala cortou a garganta de um carneiro e de uma ovelha negra.
Atraídos pelo cheiro de sangue, as almas dos mortos surgiram para beber, mas Ulisses sacou sua espada e os manteve a distância, esperando pelo aparecimento da alma de Tirésias. O primeiro a aparecer foi um elemento de sua tripulação, Elpenor, que tinha caído do teto da casa da Circe onde estava dormindo na manhã da partida e a qual, na ânsia dos outros em partir, tinha ficado sem enterro nem velório; Ulisses prometeu resolver este caso assim que possível. Quando Tirésias apareceu. Ulisses o deixou beber o sangue, e o profeta então disse-lhe que havia uma boa possibilidade para seu retorno a salvo para casa, mas deveria certificar-se em não pilhar o Rebanho do Sol na ilha de Trinácia; também o alertou sobre a situação que encontraria em Ítaca, onde pretendentes astutos estavam cercando sua fiel esposa Penélope.
Após ter ouvido o que Tirésias poderia contar-lhe, Ulisses deixou outras almas se aproximarem e beber o sangue, o que lhes possibilitou conversar com Ulisses. A primeira que surgiu era sua velha mãe, que relatou-lhe como tinha morrido e fez um triste relato do estado lamentável de seu pai Laerte e os bravos esforços de Penélope para repelir seus pretendentes. Ulisses, tocado pelo pesar e desejando confortar tanto a si próprio como a sua mãe, tentou três vezes abraça-la, mas nas três vezes se desvaneceu entre seus braços e o deixou segurando o ar.
Outras heroínas aproximaram-se e conversaram, e a seguir veio Agamenon, que contou a Ulisses sobre sua morte sangrenta, confortando-o com a ideia que Penélope nunca agiria como Clitemnestra. Aquiles também se aproximou, e Ulisses saudou-o como o homem mais afortunado que já havia vivido, um poderoso príncipe entre os vivos e os mortos. Aquiles respondeu que preferiria ser um escravo vivo do que um rei morto, mas Ulisses o consolou com notícias das façanhas de seu filho Neoptóemo, e partiu feliz.
Durante esta visita Ulisses viu alguns dos famosos componentes do mundo dos mortos; Sísifo eternamente empurrando sua grande pedra montanha acima, com ela escorregando de volta assim que chegava ao topo; e Tântalo, enfiado até o pescoço dentro de uma pequena lagoa com água, a qual desaparecia quando se inclinava para bebê-la, com ramos de frutas pendentes sobre sua cabeça que sumiam quando ele tentava alcança-las. Ulisses queria ver mais, e encontrou o fantasma do poderoso Hércules, mas antes de poder encontrar outros heróis de gerações anteriores, foi assustado por uma grande onda de mortos que vieram aos milhares em sua direção e elevaram à sua volta seus brados lúgubres e dolorosos: em pânico, retornou ao navio, soltou as amarras e cruzou de volta ao mundo dos vivos.
As Sereias, Cila e Caribde
Ulisses retomou à ilha de Circe, e assim que Elpenor foi adequadamente sepultado, Circe deu a Ulisses mais instruções para a sua jornada e para prepara-lo para os males que ainda estavam por vir. O navio velejou primeiro para a Ilha das Sereias, terríveis criaturas com cabeças e vozes de mulheres, mas com corpos de pássaros, que existiam com o propósito de atrair marinheiros para as rochas de sua ilha com doces canções. Quando o barco se aproximou, uma calmaria mortal se abateu sobre o mar, e a tripulação utilizou os remos. De acordo com as instruções de Circe, Ulisses tampou os ouvidos da tripulação com cera, enquanto ele próprio foi amarrado ao mastro. de modo que pudesse passar a salvo pelo perigo e ainda ouvir a canção. Venha para perto, Ulisses, cantavam as Sereias. Ulisses gritou para seus homens para que o soltassem, mas remaram resolutamente para a frente, e o perigo acabou passando.
A próxima tarefa era navegar os dois locais perigosos de Cila e Caribde. Caribde era um terrível redemoinho, que alternativamente sugava e atirava para cima a água; os marinheiros prudentes que escolheram evita-lo, foram forçados a encontrar, ao invés, a igualmente terrível Cila. Cila ocultava-se numa caverna localizada no alto de um rochedo, disfarçada pela névoa e vapor de água dos vagalhões abaixo; possuía doze pés que balançavam no ar e seis pescoços, cada um equipado com uma monstruosa cabeça com três fileiras de dentes. Da sua caverna exigia urna faixa de vítimas humanas dos barcos que passavam abaixo. Ulisses, alertado por Circe, decidiu não contar a seus marinheiros sobre Cila; passando mais ao largo possível de Caridbe, eles passaram diretamente abaixo do rochedo de Cila, e, apesar de Ulisses estar armado e preparado para lutar com ela pela vida da tripulação, conseguiu escapar de sua vigilância e teve sucesso em arrebatar seis vítimas aos berros.
Rebanho do Sol
A seguir, o navio aproximou-se da ilha de Trinácia, um local de pasto farto onde mantinha seu rebanho do gado gordo. Ulisses tinha sido alertado tanto por Circe como por Tiréias que, se esperava alcançar Ítaca vivo, deveria evitar este local e, a qualquer custo, não tocar neste gado. Explicou Isto a seus homens, mas, cansados e deprimidos pela perda de mais seis camaradas, insistiram em lançar âncora e passar a noite na praia. Deparando-se com um motim, Ulisses tinha poucas opções além de concordar, mas os fez jurar que deixariam o gado em paz. Naquela noite formou-se uma tempestade, e por todo um mês o vento soprou do sul, sendo impossível continuarem sua viagem.
Enquanto possuíam as provisões que Circe tinha lhes dado, os homens mantiveram sua promessa e não tocaram no gado. Mas sua comida acabou por terminar e, movidos pela fome, aproveitaram a oportunidade de uma ausência temporária de Ulisses para abater alguns dos mais belos exemplares do rebanho; consideravam que se os sacrificassem em honra dos deuses, os deuses dificilmente ficariam irados. Ulisses retomou sentindo o odor da carne assada; repreensão era inútil, pois o mal estava feito, e os deuses estavam determinados a vingar o crime. Quando a carne terminou, o vento amainou, assim o navio pode zarpar; mas nem bem estava no mar quando uma terrível borrasca surgiu e o barco foi primeiramente esmagado pela força das ondas, e a seguir feito em pedaços por um raio. Toda a tripulação se perdeu, salvo o próprio Ulisses, que conseguiu agarrar-se aos destroços do mastro e quilha, no qual permaneceu por dez dias até que foi jogado nas areias da ilha de Pgigia, morada da linda ninfa Calipso.
Calipso
Calipso tornou Ulisses seu amante e ficou com ela por sete anos, pois não tinha meios de escapar. A deusa Atena acabou enviando Hermes, mensageiro dos deuses, para explicar à ninfa que era chegada a hora de deixar seu visitante seguir seu caminho. Calipso, apesar de relutante em perdê-lo, sabia que devia obedecer, assim forneceu a Ulisses material para a confecção de uma jangada, deu-lhe comida e bebida e invocou um vento suave para leva-lo de volta a Ítaca. Sem incidentes, aproximou-se da terra dos Feácios, grandes marinheiros que estavam destinados a leva-lo na última etapa de sua viagem. Mas então Possídon interviu: detestava Ulisses pelo que tinha causado a seu filho, o Ciclope Polifemo, e agora estava irado por vê-lo tão próximo do fim de sua jornada. Então, enviou outra tempestade, que partiu o mastro da jangada e a deixou ser levada pelo vento. Como o vento norte na época de colheita arremessa pelos campos uma bola de cardo, o mesmo ocorreu com a sua jangada, indo para cima e para baixo sobre as ondas. Agora o Vento Sul o jogaria para o Norte como um jogo, e agora o Leste o deixaria para ser perseguido pelo Oeste.
Ulisses foi salvo da morte certa pela intervenção da ninfa marinha Ino. Ela deu-lhe seu véu, instruindo-o a atá-la ao redor da cintura e então a abandonar o barco e se dirigir para a praia. Como uma grande onda despedaçou sua jangada, Ulisses fez o que tinha lhe sido dito. Por dois dias e duas noites nadou em frente, mas no terceiro dia alcançou as praias de Feácia e acabou conseguindo chegar à costa rochosa na foz de um rio. Atirou o véu de Ino de volta ao mar e deitou-se numa moita espessa para dormir.
De Urano a Crono
A primeira fase do Cosmo segue-se o que se poderia chamar estágio intermediário em que Urano (Céu) se une a Géia (Terra), de que procede numerosa descendência: Titãs, Titânidas, Ciclopes, Hecatonquiros, além dos que nasceram do sangue de Urano e de todos os filhos destes e daqueles. A união de Urano e Géia é o que se denomina hierogamia, um casamento sagrado, cujo objetivo precípuo é a fertilidade da mulher, dos animais e da terra. É que o casamento sagrado “atualiza a comunhão entre os deuses e os homens; comunhão por certa passageira, mas com significativas consequências. Pois a energia divina convergia diretamente sobre a cidade – em outras palavras, sobre a Terra. – Santificava-a e lhe garantia a prosperidade e a felicidade para o ano que começava”. Essas hierogamias se encontram em quase todas as tradições religiosas. Simbolizam não apenas as possibilidades de união com os deuses, mas também uniões de princípios divinos que provocam certas hipóstases. Uma das mais célebres dessas uniões é a de Zeus (o poder, a autoridade) e Têmis (a justiça, a ordem eterna) que deu nascimento a Eunomia (a disciplina), Irene (a paz) e Dique (a justiça).
Curioso que o casamento, instituição que preside à transmissão da vida, aparece muito aureolado de um culto que exalta e exige a virgindade, simbolizando, vezes assim, a divina da vida, de que as uniões do homem e da mulher são apenas origem projeções, receptáculos, instrumentos e canais transitórios. No Egito havia as esposas de Amon deus da fecundidade. Eram normalmente princesas, consagradas ao deus e, que dedicavam sua virgindade a essa teogamia. Em Roma, as Vestais, sacerdotisas de Vesta, deusa da lareira doméstica, depois deusa da Terra, a Deusa Mãe, se caracterizavam por uma extrema exigência de pureza. Retornando à primeira geração divina, temos inicialmente o seguinte quadro:
Titãs
Em grego (Titán), é aproximado, em etimologia popular, de (títaks), rei, e (titéne), rainha, termos possivelmente de procedência oriental: nesse caso, Titã significaria soberano, rei. Carnoy prefere admitir que os Titãs tenham sido primitivamente deuses solares e seu nome se explicaria pelo pelágico Tita, brilho, luz. A primeira hipótese parece mais clara e adequada às funções dos violentos Titãs no mito grego. Os Titãs simbolizam as forças brutas da terra e, por conseguinte, os desejos terrestres em atitude de revolta contra o espírito, isto é contra Zeus. Juntamente com os Ciclopes, os Gigantes e os Hecatonquiros representam as manifestações elementares, as forças selvagens e insubmissão da natureza nascente, prefigurando a primeira etapa da gestação evolutiva. Ambiciosos, revoltados e indomáveis, adversários tenazes do espírito consciente, patenteado em Zeus, não simbolizam apenas as forças brutas da natureza, mas, lutando contra o espírito exprimem a posição à espiritualização harmonizante. Sua meta é a dominação, o despotismo.
Oceano
Em grego (Okeanós), sem etimologia ainda bem definida. É possível que se trate de palavra oriental com o sentido de circular, envolver. Parece que Oceano era concebido, a princípio, como um rio-serpente, que cercava e envolvia a terra. Pelo menos esta é a ideia que do mesmo faziam os sumérios, segundo os quais a Terra estava sentada sobre o Oceano, o rio-serpente. No mito grego, Oceano é a personificação da água que rodeia o mundo: é representado como um rio, o Rio-Oceano, que corre em torno da esfera achatada da terra, como diz Ésquilo em Prometeu Acorrentado: Oceano, cujo curso, sem jamais dormir, gira ao redor da Terra imensa.
Quando, mais tarde os conhecimentos geográficos se tomaram mais precisos, Oceano passou a designar o Oceano Atlântico o limite ocidental do mundo antigo. Representa o poder masculino, assim como Tétis, sua irmã e esposa, simboliza o poder e a fecundidade feminina do mar. Como deus, Oceano é o pai de todos os rios, que, segundo a Teogonia, são mais de três mil, bem como das quarenta e uma Oceânidas, que personificam os riachos, as fontes e as nascentes. Unidas a deuses e, por vezes, a simples mortais, são responsáveis por numerosa descendência. Ou em razão mesmo de sua vastidão, aparentemente sem limites, é a imagem Oceano, da indistinção e da indeterminação primordial.
De outro lado, o simbolismo do Oceano se une ao da água, considerada como origem da vida. Na mitologia egípcia, o nascimento da Terra e da vida era concebido como uma emergência do Oceano, à imagem e semelhança dos montículos lodosos que cobrem o Nilo, quando de sua baixa. Assim, a criação, inclusive a dos deuses, emergiu das águas primordiais. O deus primevo era chamado a Terra que emerge. Afinal. as águas simbolizam a soma de todas as virtualidades: são a fonte, a origem e o reservatório de todas as possibilidades de existência. Precedem a todas as formas e suportam toda a criação.
Oceano e suas filhas, as Oceânidas, surgem na literatura grega como personagens da gigantesca tragédia de Ésquilo, Prometeu Acorrentado. Oceano, apesar de personagem secundária na peça, um mero tritagonista, é finalmente marcado por Ésquilo: tímido, medroso e conciliador, está sempre disposto a ceder diante do poderio e da arrogância de Zeus. Com o caráter fraco de seu pai contrastam as Oceânidas, que formam o coro da peça: preferem ser sepultadas com Prometeu a sujeitar-se à prepotência do pai dos deuses e dos homens. Mesmo quando os Titãs, após a mutilação de Urano, se apossaram do mundo, Oceano resolveu não participar das lutas que se seguiram, permanecendo sempre à parte como observador atento dos fatos. Dada a pouca ou nenhuma importância dos Titãs Ceos, Crio e Hipérion no mito grego, a não ser por seus casamentos, filhos e descendentes, vamos diretamente a Crono.
Ciclope
Em grego (Kyklops), olho redondo, pois os Ciclopes eram concebidos como seres monstruosos com um olho só no meio da fronte. Demônios das tempestades, os três mais antigos são chamados, por isso mesmo, Brontes, o trovão, Estéropes, o relâmpago, e Arges, o raio.
Os mitógrafos distinguem três espécies de Ciclopes: os Urânios (filhos de Urano e Géia), os Sicilianos, companheiros de Polifemo, como aparece na Odisséia de Homero e os Construtores. Os primeiros, Brontes, Estéropes e Arges são os urânios. Encadeados pelo pai, foram, a pedido de Géia, libertados por Crono, mas por pouco tempo. Temendo-os, este os lançou novamente no Tártaro, até que, advertido por um oráculo de Géia de que não poderia vencer os Titãs sem o concurso dos Ciclopes, Zeus os libertou definitivamente. Estes, agradecidos, deram-lhe o trovão, o relâmpago e o raio. A Plutão ou Hades ofereceram um capacete que podia torna-lo invisível e a Possídon, o tridente. Foi assim, que os Olímpicos conseguiram derrotar os Titãs. A partir de então tornaram-se eles os artífices dos raios de Zeus.
Como o médico Asclépio, filho de Apolo, fizesse tais progressos em sua arte, que chegou mesmo a ressuscitar vários mortos, Zeus, temendo que a ordem do mundo fosse transtornada, fuminou-o. Apolo, não podendo vingar-se de Zeus, matou os Ciclopes, fabricantes do raio, que eliminaria o deus da medicina. O segundo de Ciclopes, impropriamente denominados sicilianos, tendem a confundir-se com aqueles de que fala Homero na Odisséia. Estes eram selvagens gigantescos, dotados de uma força descomunal e antropófagos. Viviam perto de Nápoles, nos chamados campos de Flegra. Moravam em cavernas e os únicos bens que possuíam eram seus rebanhos de carneiros. Dentre esses Ciclopes destaca-se Polifemo, imortalizado pelo cantor de Ulisses e depois, na época clássica, pelo drama satírico de Eurípedes, o Ciclope, o único que chegou completo até nós.
Na época Alexandrina, os Ciclopes homéricos transformaram-se em demônios subalternos, ferreiros e artífices de todas as armas dos deuses, mas sempre sob a direção de Efesto, o deus por excelência, das forjas. Habitavam a Sicília, onde possuíam uma oficina subterrânea. De antropófagos se transmutaram na erudita poesia Alexandrina em frágeis seres humanos, mordidos por Eros. A terceira leva de Ciclopes proviria da Lícia. A eles era atribuída a construção de grandes monumentos da época pré-histórica, formados de gigantescos blocos de pedra, cujo transporte desafiava as forças humanas. Ciclopes pacíficos, esses Gigantes se colocaram a serviço de heróis lendários, como Preto, na fortificação de Tirinto, e Perseu, na construção da fortaleza de Micenas.
Vênus
Nascimento de Vênus
Da espuma do mar, fecundada pelo sangue de Urano (o Céu) nasceu uma jovem levada em primeiro lugar para a ilha de Cítera e em seguida a Chipre. Deusa encantadora, não tardou percorrer a costa, e as flores nasciam sob os seus pés delicados. Chama-se Afrodite, Vênus, ou Citeréia, do nome da ilha a que aportou, ou ainda Cipris, do nome da Ilha em que é honrada. Pelo menos, é essa a tradição mais difundida, pois algumas lendas diferentes vieram confundir-se em Vênus que, às vezes, surge como filha de Júpiter e de Dionéia. É também a que devemos adotar, pois os artistas que representaram o nascimento de Vênus mostram sempre a deusa no momento em que sai das vagas.
Nas pinturas antigas, Vênus é frequentemente representada deitada sobre uma simples concha; nas moedas, vemo-la num carro puxado pelos Tritões e pelas Tritônidas. Finalmente, numerosos baixos-relevos no-la apresentam seguida de hipocampos ou centauros marinhos. No século dezoito, os pintores franceses e notadamente Boucher, virem no nascimento de Vênus um tema infinitamente gracioso e útil à decoração. Uma multidão de pequenos cupidos paira nos ares ou escolta a deusa. Aliás, os pintores franceses seguiram, nesse ponto, as tradições bebidas da Itália.
Conformando-se à narração dos poetas, Albane colocou a deusa num carro puxado por cavalos marinhos. Assim é que ela vai ter a Cítera, onde a aguarda Peitho (a Persuasão), que, na margem, estende os braços à jovem viajante. Cupido está sentado perto do mar; as Nereidas e os Amores montados em delfins formam o cortejo da deusa. Alegres Amores festejam a chegada de Vênus, e outros esvoaçam no ar semeando flores na passagem.
Num quadro dotado de grande frescor e brilho, que faz parte do museu de Viena, Rubens pintou a festa de Vênus em Cítera. Ninfas, sátiros e faunos dançam em torno da sua estátua, enquanto os Amores entrelaçam guirlandas de flores e enchem os ares de alegres cadências. Ao fundo, mostrou o pintor o templo da deusa. O atavio de Vênus é um tema que a arte e a poesia fixaram bem. Enquanto as Horas estavam incumbidas da educação da deusa, as Graças presidiam aos cuidados do seu atavio. Uma multidão de quadros reproduziu tão encantadora cena, e os pintores não deixaram de acrescentar todos os pormenores que lhes sugeriu a imaginação. Quando Boucher faleceu, tinha sobre o cavalete um quadro representando o atavio de Vênus. Prudhon pintou Vênus estendida num leito antigo e servida pelos Amores que lhe perfumam os cabelos, lhe estendem um espelho, queimam perfumes em torno da deusa, trazem-lhe jóias e lhe entrelaçam guir1andas de flores. Rubens também faz intervir Cupido que segura um espelho no qual a mãe se fita; infelizmente é uma velha que lhe arranja os cabelos. A velhice lenta e enrugada jamais deve aproximar-se de Vênus.
Albane, que está longe de ser artista de primeira ordem, é, no entanto, o que mais lembra, pela natureza de suas composições. as graciosas ficções da antiguidade sobre Vênus. O Atavio de Vênus, quadro que infelizmente escureceu, é talvez, a sua obra-prima como concepção mitológica. Num terraço, beira-mar, Vênus contempla-se num espelho que o Cupido lhe apresenta, enquanto as Graças lhe perfumam a linda cabeleira, e lhe arranjam os atavios. Diante dela está uma fonte onde o Amor faz que matem a sede duas pombas. Um palácio aéreo, como convém a Vênus, aparece no fundo de um tanque, ao passo que, nas nuvens, Amores alados atrelam cisnes brancos ao carro de ouro que vai conduzir o passeio a deusa, e enchem os ares dos seus melodiosos consertos.
Tipo e Atributos de Vênus
O culto sírio de Astarte, diz Ottfried Mueller, parece, encontrando na Grécia alguns indícios indígenas, ter dado nascimento ao culto célebre e difundido por toda parte de Vênus Afrodite. A Ideia fundamental da grande deusa Natureza, sobre a qual ela repousava, nunca se perdeu inteiramente; o elemento úmido que formava no Oriente o Império reservado a essa divindade continuou a ser submetido ao poder de Vênus Afrodite nas costas e nos portos em que era venerada; sobretudo o mar, o mar tranquilo e calmo, refletindo o céu no espelho úmido das suas ondas, parecia, aos olhos dos gregos, urna expressão de sua divinal natureza.
Quando a arte, no ciclo de Afrodite, deixou para trás as pedras grosseiras e os ídolos informes do culto primitivo, a ideia de uma deusa cujo poder se estende por toda parte e à qual ninguém pode resistir, animou as tuas criações; gostava-se de a representar sentada num trono, segurando nas mãos os sinais simbólicos de uma natureza repleta de mocidade e esplendor, de uma luxuriante abundância: a deusa estava inteiramente envolta nas dobras das suas vestes (a túnica mal lhe deixava à mostra urna parte do seio esquerdo) que se distinguiam pela elegância, pois precisamente nas imagens de Vênus a graça rebuscada das vestes e dos movimentos parecia pertencer ao caráter da deusa. Nas obras saídas da escola de Fídias, ou produzidas sob a influência dessa escola, a arte representa em Afrodite o princípio feminino e a união dos sexos em toda a sua santidade e grandeza.
Vê-se ali, antes, uma união durável formada com o fito do bem geral, e não uma aproximação efêmera que deve terminar com os prazeres sensuais que ele proporciona. A nova arte Ática foi a primeira que tratou do tema de Afrodite com um entusiasmo puramente sensual e que divinizou, nas representações figuradas da deusa, já não mais apenas um poder ao qual o mundo inteiro obedecia, mas antes a individualidade da beleza feminina.
Vênus dá leis ao céu, à terra, às ondas e a todas as criaturas vivas. Foi ela que deu o germe das plantas e das árvores, foi ela que reuniu nos laços da sociedade os primeiros homens, espíritos ferozes e bárbaros, foi ela que ensinou a cada ser a unir-se a uma companheira. Foi ela que nos proporcionou as inúmeras espécies de aves e a multiplicação dos rebanhos. O carneiro furioso luta, às chifradas, com o carneiro. Mas teme ferir a ovelha. O touro cujos longos mugidos faziam ecoar os vales e os bosques abandona a ferocidade, quando vê a novilha. O mesmo poder sustenta tudo quanto vive sob os amplos mares e povoa as águas de peixes sem conta. Vênus foi a primeira em despojar os homens do aspecto feroz que lhes era peculiar. Dela foi que nos vieram o atavio e o cuidado do próprio corpo. (Ovídio).
Vênus Celeste e Vênus Vulgar
Pausânias, na sua descrição de Tebas, assinala várias estátuas de Vênus, da mais alta antiguidade, pois haviam sido feitas com o lenho dos navios de Cadmo e consagradas pela própria Harmonia. A primeira, diz ele, é Vênus celeste, a segunda Vênus vulgar, e a terceira é chamada preservadora. Foi a própria Harmonia que lhe impôs tais nomes para distinguir essas três espécies de Amores: um celeste, ou seja, casto, outro vulgar, ou seja, preso ao corpo, o terceiro desordenado, que leva os homens às uniões incestuosas e detestáveis. Era à Vênus preservadora que se dirigiam às preces para a preservação dos desejos culposos. (Pausânias). Temos interessante exemplo desse ótimo aspecto de Vênus numa decisão do senado romano, o qual, segundo os livros sibilinos consultados pelos decênviros, ordenara a dedicação de uma estátua de Vênus vesticordia (convertedora), como meio de reconduzir as moças devassas ao pudor do sexo. (Valério Máximo).
A tartaruga, emblema da castidade das mulheres, era consagrada a Vênus celeste, e o bode, símbolo contrário, consagrado à Vênus vulgar. As Imagens da deusa, que se encontravam em todas as casas, eram, além de tudo, acompanhadas de inscrições que Indicavam o seu caráter. Eis aqui uma que chegou até nós: “Esta Vênus não é a Vênus popular, é a Vênus urânia. A casta Crisógona colocou-a na casa de Amphicles, a quem deu vários filhos, comoventes penhores da sua ternura e fidelidade. Todos os anos, o primeiro cuidado desses felizes esposos é de vos invocar, poderosa deusa, e em prêmio da sua piedade, todos os anos lhes aumentais a ventura. Prosperam sempre os mortais que honram os deuses”. (Teócrito). Vênus celeste está caracterizada pela veste estrelada. Vemo-la figurada numa pintura de Pompéia onde está representada de pé com um diadema na cabeça e um cetro na mão. O famoso escultor Scopas fizera para a cidade de Élis uma Vênus vulgar que pusera sentada sobre um bode; figura análoga se encontra em outra pedra gravada antiga. No século XIX, o pintor Gleyre compôs um belíssimo quadro sobre o mesmo tema. Essa Vênus era sobretudo honrada em Corinto, cidade marítima que sempre se celebrizou pelas cortesãs. Ali é que vivia a famosa Laís, em tomo da qual se lê o seguinte epigrama na Antologia: “Eu, altiva Laís, de quem a Grécia era joguete, eu que tinha à porta um enxame de jovens amantes, consagro a Vênus este espelho, pois não desejo ver-me tal qual sou, e já não posso ver-me tal qual era.
Encontra-se na mesma coletânea outro trecho ainda mais interessante: Minarete, que há pouco estendia os fios da trama e sem cessar fazia ressoar a lançadeira de Minerva, acaba de consagrar a Vênus o seu cesto de trabalho, as suas lãs e os seus fusos, todos instrumentos seus de labor, queimando-os no altar: “Desaparecerei, exclamou, instrumentos que deixais morrer de fome as pobres mulheres e murchais a beleza das Jovens!” Depois pegou coroas um alaúde e pôs-se a levar vida alegre nas festas e nos banquetes. “Ó Vênus, diz ela à deusa, hei de trazer-te o dízimo dos meus benefícios; proporciona-me trabalho no teu interesse e no meu” (Antologia).
Pigmaleão e a sua Estátua
A ilha de Chipre era particularmente renomada pelas cortesias. O escultor Pigmaleão que ali vivia sentiu-se de tal modo impressionado com a desfaçatez das mulheres do país, que resolveu viver no celibato. Mas como a sua imaginação sonhasse constantemente com uma formosura de caráter diferente, esculpiu uma estátua de marfim, representando uma mulher que à castidade de expressão unia a pureza das formas. A Imagem lhe agradou tanto, que por ela se apaixonou; infelizmente faltava a vida àquela pudica beleza, e quando Pigmaleão contemplava as mulheres vivas, via nelas a beleza, mas nunca o pudor. Ao chegar o dia da festa de Vênus, dia que com tamanha magnificência se celebra na ilha de Chipre, Pigmaleão dirigiu-se ao templo da deusa, que encontrou perfumado com incenso, e rodeado de novilhas brancas, cujas pontas haviam sido douradas e que seriam imoladas. “Grande deusa, exclamou abraçando o altar, faze com que me tome marido de mulher perfeita como a estátua que esculpi!”.
Parece que não estava em poder da deusa descobrir em Chipre mulher provida da casta beleza sonhada pelo artista, pois Vênus, para lhe ser agradável, preferiu recorrer ao milagre. Com efeito, quando o escultor voltou, foi abraçar a estátua, e viu-lhe as faces corar: o marfim amoleceu-se e a estátua animou-se. Pigmaleão, encantado, agradeceu à deusa, que desejou pessoalmente assistir ao himeneu. A história de Pigmaleão constitui o tema do último quadro pintado por Girondet, e que figurou no salão de 1819. Não se imagina a quantidade de brochuras aparecidas desde então para louvar ou criticar o pintor. O mais interessante foi que os médicos houveram por bem mesclar-se à discussão, e examinar, com ridícula seriedade, a questão de saber se o artista tivera razão em animar, primeiramente, a cabeça da estátua, cujas pernas continuam ainda de marfim, e se teria sido mais conveniente fazer recomeçar a vida pelo peito, que encerra o coração e os pulmões.
A estátua animada por Pigmaleão deu-lhe um filho que foi fundador de Patos, cidade de Chipre, célebre pelo culto ali prestado a Vênus.
Vênus de Cnido
Na origem, não se tinha o hábito de representar Vênus, no instante em que sai da espuma do mar, ou seja, inteiramente nua. Assim, foi a obra de Praxíteles considerada novidade, e a própria deusa testemunha, pela boca de um antigo autor, o espanto por se ver assim desprovida de vestes. “Mostrei-me a Páris, Anquises e Adônis é verdade, mas onde foi que Praxíteles me viu?” (Antologia). Narra Plínio que Praxíteles, a quem os habitantes de Cos haviam encomendado uma Vênus, lhes deu a escolher entre duas estátuas, uma das quais estava vestida, ao passo que a outra estava nua. Preferiram eles a primeira, e Praxíteles vendeu a segunda aos habitantes de Cnido que se congratularam com a compra, pois ela granjeou reputação e fortuna ao país. A Vênus de Cnido parece ter sido o tipo da maioria das estátuas da deusa, quando se representava no momento do nascimento.
O Júpiter de Fídias e a Vênus de Cnido por Praxíteles eram considerados, nos diferentes gêneros, dois produtos dos mais perfeitos da escultura. Dizia Plínio: “De todas as partes da terra, navega-se em direção a Cnido, para contemplar a estátua de Vênus.” O rei Nicomedes ofereceu aos cnidianos, em troca da estátua, a totalidade das dívidas deles, que eram importantes. Recusaram a oferta, e com razão, acrescenta Plínio, pois a obra-prima constitui o esplendor da cidade. Uma multidão de escritores da Antiguidade nos legou sinais da admiração que lhes inspirava a obra-prima para a qual se fizera a seguinte inscrição: Ao verem a Vênus de Cnido, Minerva e Juno disseram uma à outra: Não acusemos mais Páris.
Entre as numerosíssimas estátuas que podem prender-se à mesma série, a mais famosa é a Vênus de Médicis, situada na tribuna da Galeria de Florença. Eis a descrição que dela fazia o catálogo do Louvre, onde figurou durante quinze anos: -A deusa dos Amores acaba de sair da espuma do mar, onde nasceu; a beleza virginal aparece, na margem encantada de Cítera, sem outro véu que a atitude de pudor. Se a cabeleira lhe não flutua sobre os divinos ombros, é por que as Horas. com as suas mãos celestiais, acabam de lha arranjar (Hino homérico). Um delfim e uma concha estão aos seus pés: são os símbolos do mar, elemento natal de Vênus.
Os dois Amores que o encimam não são os filhos da deusa. Um deles é o Amor primitivo (Eros) que desemaranhou o Caos; o outro é o Desejo (Himeros) que aparecera no mundo ao mesmo tempo que o primeiro ser sensível. Ambos a viram nascer e jamaIs se lhe afastaram dos passos (teogonia de Hesíodo). A Vênus de Médicis tem as orelhas furadas, como já se observou em outras estátuas da mesma deusa; sem dúvida pendiam delas esplêndidos brincos. O braço esquerdo conserva no ano o sinal evidente do bracelete chamado spinther, representado em escultura em várias das suas imagens. Uma inscrição colocada sobre o plinto nos diz que o autor da Vênus de Médicis é Cleômenes, ateniense, filho de Apolodoro.
Vênus nem sempre está de pé quando sai das águas, e uma numerosa série de estátuas, ordinariamente designadas com o nome de Vênus agachadas, apresenta-nos a deusa apoiando um dos joelhos ao chão para tomar a erguer-se. O nome da Vênus no banho também lhe é atribuído. Quando a deusa aperta a cabeleira úmida, chamam-lhe de Vênus anadiomene. Apeles fizera uma Vênus anadiomene da qual os antigos elogiavam bastante a beleza. Os habitantes de Cos exigiram outra Vênus semelhante, do mesmo artista, mas ele morreu deixando a obra incompleta.
A Vênus de Apeles foi celebrada várias vezes na Antologia: “Esta Vênus, que sai do seio materno das águas, é obra do pincel de Apeles. VI como, pegando com a mão a cabeleira molhada, espreme a água! Agora as próprias Juno e Minerva dirão: “Não queremos mais disputar-lhe o premio da beleza” (Antologia).
Vênus Genitrix
Considerada como geradora do gênero humano, Vênus está sempre vestida. Nas estátuas, as dobras da sua veste indicam frequentemente que está molhada, e às vezes traz um dos seios descobertos, por ser a nutriz universal. As medalhas a mostram vestida e com os dois seios cobertos, mas ela está frequentemente acompanhada de um menino: a deusa, nesse caso, recebe o nome de Vênus genitrix. Temos no Louvre uma bela estátua de Vênus genitrix com um seio descoberto; de resto, o mesmo tipo se encontra quase idêntico em vários museus.
Vênus Vitoriosa
Dá-se este nome a Vênus quando ela usa as armas de Marte. Com efeito, vemos, em várias pedras gravadas, uma figura de Vênus segurando na mão um capacete. Às vezes está ainda acompanhada de um escudo ou de troféus de armas. Outras segura numa das mãos o capacete, e na outra uma palma. Essas figuras nos mostram sempre Vênus triunfante contra Marte, como consequência da mesma ideia que deu nascimento a lenda de Hércules fiando aos pés de Onfales. É sempre a beleza a dominar a força. A associação de Marte e Vênus está igualmente fixada em duas pinturas de Herculanum, onde se nos deparam Amores preparando o trono das duas divindades. Um capacete está representado no trono de Marte e uma pomba no de Vênus. A pomba é, com efeito, o atributo especial de Vênus, como o capacete é o atributo de Marte.
Colocam-se, outrossim, entre as Vênus vitoriosas uma série de estátuas que só têm vestes para cobrir os membros Inferiores, e que têm por caráter determinante a colocação de um dos pés sobre uma pequena elevação. Tal postura implica a ideia da dominação sobre Marte, quando é um capacete que suporta o pé e sobre o mundo, quando ele se apoia simplesmente num rochedo. Neste caráter, não tem a deusa a graça que se lhe dá como Vênus nascente; pelo contrário, assume as atitudes de heroína. As formas do corpo estão repletas de vigor e força, e as feições possuem uma expressão de brutalidade desdenhosa muito distante do sorriso. A Vênus de Milo é considerada o tipo mais completo dessa classe de estátuas. A beleza grave e sem afetação de tal figura nada tem do agradável coquetismo que a maioria dos artistas dos últimos séculos considera apanágio essencial da mulher. Foi no mês de fevereiro de 1820 que um pobre camponês grego a descobriu, remexendo as terras do seu jardim. A estátua, feita de mármore de Paros, está constituída por dois blocos cuja união se oculta mediante as dobras da túnica.
Afrodite
Deusa do amor e da beleza. Na lenda de Homero, ela é dita como sendo a filha de Zeus e Dione, uma de suas consortes, mas na Teogonia de Hesíodo, ela é descrita como nascida da espuma do mar e, etimologicamente, seu nome quer dizer “erguida da espuma.” De acordo com Homero, Afrodite é a esposa de Hefaístos, o deus das artes manuais. Seus amantes incluem Ares, deus da guerra, que posteriormente foi representado como seu marido. Era a rival de Perséfone, rainha do mundo subterrâneo, pelo o amor do belo jovem Adônis. Talvez a lenda mais famosa sobre Afrodite diga respeito à causa da Guerra de Tróia. Eris, a personificação da discórdia – a única deusa que não foi convidada ao casamento de Peleu e da ninfa Tétis – ressentida com os deuses, arremessou uma maçã dourada no corredor onde se realizava o banquete, sendo que na fruta estavam gravadas as palavras “à mais bela.” Quando Zeus se recusou a julgar entre Hera, Atena, e Afrodite, as três deusas que reivindicaram a maçã, elas pediram à Páris, príncipe de Tróia, para fazer a premiação. Cada deusa ofereceu à Paris um suborno: Hera, prometeu-lhe que seria um poderoso governante; Atena, que ele alcançaria grande fama militar; e Afrodite, que ele teria a mulher humana mais linda do mundo. Páris declarou Afrodite como a mais bela e escolheu como prêmio Helena, a esposa do rei grego Menelau. O rapto de Helena por Páris foi a causa da Guerra de Tróia.
Anfitrite
Deusa do mar, filha de Nereu ou de Oceano, e esposa de Posêidon. Na escultura, ela frequentemente aparece sentada próxima à Posêidon numa carruagem puxada por Tritões.
Ares
Deus da guerra e filho de Zeus, rei dos deuses, e sua esposa, Hera. Os romanos o identificaram com Marte, também um deus da guerra. Ares, sanguinário e agressivo, personificava a natureza brutal da guerra. Era impopular tanto com os deuses quanto com os humanos. Entre as divindades associadas com Ares estavam sua mulher Afrodite, deusa do amor, e divindades menos importantes, como Deimos (o Temor) e Fobos (o Tumulto), que o acompanhavam em batalha. Embora Ares fosse bélico e feroz, não era invencível, mesmo contra os mortais. A adoração de Ares, que se acredita ter origem na Trácia, não se estendia à toda a antiga Grécia, e onde existiu, não tinha importância social ou moral. Ares era uma divindade ancestral de Tebas e tinha um templo em Atenas, aos pés do Areópago, ou Colina de Ares.
Aristeu
Filho de Apolo e da ninfa Cirene. Era adorado como o protetor dos caçadores, pastores e rebanhos, e como o inventor da apicultura e da arte de cultivar azeitonas. Quando Aristeu tentou seduzir Eurídice, a esposa do célebre músico Orfeu, ela fugiu dele e acabou sendo mortalmente ferida com a picada de uma cobra. As ninfas o puniram fazendo todas as suas abelhas morrerem. Mas ele amenizou as ninfas com um sacrifício de seu gado, de cujas carcaças emergiram novas colmeias de abelhas. Aristeu era conhecido nas artes da cura e da profecia, e vagou por muitas terras para compartilhar seu conhecimento e curar doentes. Era largamente venerado como um deus beneficente e frequentemente era representado como um pastor juvenil carregando um cordeiro.
Ártemis
Uma das principais deusas. Era a filha de Zeus e de Leto, e a irmã gêmea de Apolo. Era a caçadora-chefe dos deuses e a deusa da caça e dos animais selvagens, especialmente os ursos. Ártemis era também a deusa do parto, da natureza e da colheita. Como deusa de lua, ela às vezes foi identificada com as deusas Selene e Hécate. Embora tradicionalmente seja a amiga e protetora das mulheres, especialmente as jovens, Ártemis impediu os gregos de navegar até Tróia durante a guerra até que eles sacrificassem uma virgem para ela. De acordo com algumas histórias, justamente antes do sacrifício, ela salvou a vítima, a jovem Ifigênia. Como Apolo, Ártemis se armava de um arco e flechas, com o qual ela frequentemente punia mortais que a ofendiam. Em outras lendas, ela é elogiada por dar às mulheres jovens que morriam nos partos uma morte rápida e sem dor.
Asclépio
O deus da medicina. Era filho de Apolo e da virgem Coronis, da Tessália. Zangado porque Coronis era infiel a ele, Apolo matou-a e arrancou o nascituro Asclépio de seu ventre. Mais tarde ele enviou Asclépio ao centauro Quíron para ser educado. Asclépio aprendeu com Quíron a arte da cura e logo se tornou um grande médico. Por Asclépio ameaçar a ordem natural das coisas e por ressuscitar os mortos, Zeus o matou com um trovão. O culto à Asclépio centralizou-se em Epidauro, mas era popular por todo o mundo Greco-Romano. Os santuários de Asclépio funcionavam como refúgios para restabelecer a saúde, onde regimes terapêuticos tais como exercícios e dietas eram prescritos. A prática mais importante associada com as curas era o ritual da incubação, em que as pessoas aflitas eram adormecidas dentro de um templo ou cerco sagrado na esperança de que o deus viesse ter com eles em seus sonhos e prescrevesse a cura para suas doenças.
Palas Atena
Deusa da Sabedoria, também chamada de Atena. Filha de Zeus e de sua primeira mulher, Métis, deusa da Prudência. Segundo a tradição, quando Métis estava grávida, Zeus a engoliu, por temer que seu filho viesse a destroná-lo. Mais tarde, atormentado por uma dor de cabeça, pediu a Hefaístos que lhe abrisse o crânio com uma machadada. De sua cabeça saiu Atena, armada e coberta com o elmo do Saber. Uma deusa virgem, era chamada Parthenos (“a virgem”). Seu templo mais importante, o Partenon, estava em Atenas, que, de acordo com a lenda, tornou-se seu por ter dado de presente aos atenienses a árvore da oliveira. Atena era principalmente a deusa das cidades gregas, da indústria e das artes, e mais tarde, tornou-se a deusa da sabedoria.
Era também deusa da guerra. Atena foi forte defensora dos gregos na Guerra de Tróia. Depois da queda de Tróia, entretanto, os gregos não conseguiram respeitar a santidade de um templo de Atena em que a profetisa Cassandra procurou abrigo. Como castigo, tempestades enviadas pelo deus do mar, Posêidon, a pedido de Atena, destruiu a maioria dos navios gregos que retornavam de Tróia. Atena era também uma patrona das artes agrícolas e do artesanato feminino, especialmente a arte de tecer e fiar. Entre seus presentes ao homem estava a invenção do arado, a arte de domesticar animais, construção de navios e a confecção de sapatos. Ela frequentemente era associada com pássaros, especialmente a coruja.
Cárites
Graças (ou Cárites), as três deusas da alegria, charme e beleza. As filhas de Zeus e da ninfa Eurínome. Chamavam-se Aglaia (o Esplendor), Eufrosina (a Alegria) e Tália (a Floração). As Graças presidiam sobre os banquetes, danças e todos os outros eventos sociais agradáveis, trazendo alegria e boa vontade tanto para os deuses quanto para os mortais. Eram as auxiliares especiais das divindades do amor, Afrodite e Eros, e junto com as Musas, cantavam aos deuses no Monte Olimpo, dançado linda músicas que Apolo produzia em sua lira. Em algumas lendas Aglaia casou-se com Hefaístos, o artesão dos deuses. Seu casamento explica a tradicional associação das Graças com as artes; como as Musas, acreditava-se que elas davam o dom aos artistas e poetas para a criação de lindos trabalhos de arte. As Graças raramente eram tratadas como indivíduos, mas sempre como uma espécie de encarnação tripla de graça e beleza. Na arte elas normalmente são representados como jovens virgens dançando num círculo.
Ceres
Na mitologia romana, a deusa da agricultura. Ela e sua filha Prosérpina eram as representações gregas de Deméter e Perséfone. A crença Grega de que a alegria de Deméter em reunir-se com sua filha a cada primavera trazia à terra um período de abundância em frutas e grãos foi introduzida em Roma no século V a.C., e seu culto tornou-se extremamente popular, especialmente entre os plebeus. A palavra cereal deriva de seu nome.
Destinos
As três deusas que determinavam a vida humana e seu encadeamento. Conhecidas como Moiras, os Desatinos repartiam para cada pessoa, no momento de seu nascimento, uma parcela do bem e do mau, embora uma pessoa pudesse acrescer o mau em sua vida por si própria. Retratadas na arte e na poesia como mulheres velhas e severas, ou como virgens sombrias, as deusas eram frequentemente vistas como fiadeiras. Cloto, a fiadeira, tecia o fio da vida; Láquesis, a distribuidora de quinhões, decidia a quantidade e designava o destino de cada pessoa; e Átropos, a inexorável, carregava o poder de cortar o fio da vida no tempo designado. As decisões dos Destinos não podiam ser alteradas, nem mesmo pelos deuses.
Dione
De acordo com a Ilíada de Homero, Dione seria a mãe de Afrodite. Entretanto, há uma outra lenda para o nascimento da deusa do amor.
Dionísio
Deus do vinho e da vegetação, que mostrou aos mortais como cultivar as videiras e fazer vinho. Filho de Zeus, Dionísio normalmente é caracterizado de duas maneiras. Como o deus da vegetação – especificamente das árvores frutíferas – ele frequentemente é representado em vasos bebendo em um chifre e com ramos de videira. Ele eventualmente tornou-se o popular deus do vinho e da alegria, e milagres do vinho eram reputadamente representados em certos festivais de teatro em sua homenagem. Dionísio também é caracterizado como uma divindade cujos mistérios inspiraram a adoração ao êxtase e o culto às orgias. As bacantes era um grupo de devotos femininos que deixavam seus lares para vagar de maneira errante em busca de êxtase em devoção à Dionísio. Usavam peles de veado e a eles eram atribuídos poderes ocultos. Dionísio era bom e amável àqueles que o honravam, mas trazia loucura e destruição para aqueles que desprezavam as orgias a ele dedicadas.
De acordo com a tradição, Dionísio morria a cada inverno e renascia na primavera. Para seus seguidores, este renascimento cíclico, acompanhado pela renovação da terra com o reflorescer das plantas e a nova frutificação das árvores, personificavam a promessa da ressurreição de Dionísio. Os rituais anuais em homenagem à ressurreição de Dionísio gradualmente foram se desenvolvendo no drama grego, e importantes festivais eram celebrados em honra do deus, durante os quais grandes competições dramáticas eram conduzidas. O festival mais importante, as Dionisíacas, era celebrado em Atenas por cinco dias a cada primavera. Foi para estas celebrações que os dramaturgos Ésquilo, Sófocles, e Eurípides escreveram suas grandes tragédias. Por volta do século V a.C., Dionísio era também conhecido entre os gregos como Baco, um nome que se referia aos altos brados com os quais Dionísio era adorado nas orgias, ou mistérios dionisíacos. Estas celebrações frenéticas, que provavelmente se originaram em festivais primaveris, ocasionalmente traziam libertinagem e intoxicações.
Esta foi a forma de adoração pela qual Dionísio tornou-se popular no século II a.C., na Itália, onde os mistérios dionisíacos eram chamados de Bacanália. As indulgências das Bacanálias tornaram-se extrema, e as celebrações foram proibidas pelo Senado Romano em 186 a.C.. Entretanto, no século I d.C. os mistérios dionisíacos eram ainda populares, como se evidencia em representações encontradas em sarcófagos gregos.
Éolo
Nome de duas figuras mitológicas. Era melhor conhecido como o deus dos ventos. Vivia em Eólia, uma ilha flutuante, com seus seis filhos e seis filhas. Zeus tinha lhe dado o poder de acalmar e despertar os ventos. Quando o herói grego Odisseu (Ulisses) visitou Éolo, ele foi recebido como um convidado de honra. Como presente de Éolo, ao partir, Odisseu (Ulisses) recebeu dele um vento favorável e uma sacola de couro repleta com todos os ventos. Os marinheiros de Odisseu (Ulisses), pensando se tratar de uma sacola com ouro, abriram-na e a costa foi imediatamente varrida pelos ventos. Depois disso, Éolo se recusou a ajudá-los novamente. Outro Éolo na mitologia grega foi o rei da Tessália. Era o filho de Heleno, antepassado dos Helenos, os primeiros habitantes da Grécia. Éolo era o antepassado dos gregos Eólios.
Eros
O deus do amor e relativo do Cupido romano. Na mitologia antiga, era representado como uma das forças primitivas da natureza, o filho do Caos, e a encarnação da harmonia e do poder criativo do universo. Logo, entretanto, passou a ser visto como um rapaz intenso e bonito, assistido por Pótos (“ânsia”) ou Hímero (“desejo”). Mais tarde a mitologia transformou-o no auxiliar constante de sua mãe, Afrodite, a deusa do amor. Na arte grega, Eros era retratado como um jovem alado, ligeiro e bonito, frequentemente com olhos cobertos para simbolizar a cegueira do amor. Às vezes ele carregava uma flor, mas mais comumente um arco de prata e flechas, com o qual ele atirava dardos de desejo contra o peito de deuses e homens. Nas lendas e na arte romana, Eros degenerou numa criança maligna e frequentemente era retratado como um bebê arqueiro.
Eumênides
Antigos espíritos da terra ou deusas associados à fertilidade, mas também tendo certas funções sociais e morais. Tradicionalmente em número de três, as Eumênides eram adoradas em Atenas e em terras fora da Ática. Embora seu nome por vezes queira dizer “as benevolentes” “as graciosas,” e “as veneráveis,” as deusas eram normalmente retratadas como as Górgonas, criaturas com cobras ao invés de cabelos e olhos injetados de sangue. Sua aparência vai de encontro com sua identificação, em outras lendas, com as Erínias, três deusas vingativas do mundo inferior. Na sua peça “As Eumênides”, o dramaturgo ateniense Ésquilo contou a perseguição de Orestes pelas Erínias, depois que aquele matou sua mãe, Clitemnestra, para se vingar da morte de seu pai, Agamenon, o qual Clitemnestra havia assassinado. Sem se importarem com os motivos que o levaram a cometer o crime, as Erínias perseguiram Orestes por toda a parte, até Atenas. Aí Orestes apelou à deusa Atena, que presidiu seu julgamento e lançou o voto decisivo a favor de sua absolvição. Depois deste julgamento, as Erínias aceitaram um novo papel como guardiãs da justiça e tornaram-se conhecidas como as Eumênides.
Fúrias
Eram as três divindades que administravam a vingança divina, sendo elas: Tisífona (a vingança contra os assassinos), Megera (o ciúme) e Alecto (a raiva contínua). Em muitas versões sobre as Erínias, diz-se que elas são as filhas de Géia e Urano; às vezes eles são chamada de “as filhas da Noite”. Viviam no mundo subterrâneo, do qual ascendiam para a terra e perseguir o mau. Eram justas, mas sem piedade e jamais analisavam as circunstâncias que levaram a pessoa à cometer o erro. Puniam todas as ofensas contra a sociedade humana tal como o perjúrio, a infração dos rituais de hospitalidade e, acima de tudo, o assassinato de parentes de sangue. Estas deusas terríveis eram horríveis para serem contempladas; tinham cobras se retorcendo no lugar dos cabelos e olhos injetados de sangue. Atormentavam os malfeitores perseguindo-os de lugar à lugar através da terra, enlouquecendo-os. Uma das lendas mais famosas sobre as Erínias consiste em sua perseguição sem descanso pelo príncipe tebano Orestes, pelo assassinato de sua mãe, a rainha Clitemnestra. Orestes havia sido guiado por Apolo para se vingar da morte de seu pai, o rei Agamenon, a quem Clitemnestra havia assassinado.
Entretanto, as Erínias, indiferentes a seus motivos, perseguiam-no e o atormentavam. Orestes finalmente apelou à deusa Atena, que convenceu as deusas vingadoras a aceitar o apelo de Orestes de que ele era livre de culpa. Quando eram capazes de mostrar misericórdia, elas também se transformavam. Das Fúrias de aparência assustadora, transformavam-se nas Eumênides, protetoras dos suplicantes.
Géia
Géia ou Ge, a personificação da Mãe-Terra, e a filha de Caos. Era a mãe e esposa do Pai-Paraíso, personificado como Urano. Eram os pais das primeiras criaturas que vieram a existir: os Titãs; os Ciclopes; e os Gigantes ou Hecatônquiros (Cem Cabeças). Temendo e odiando os Gigantes, apesar deles serem seus filhos, Urano prendeu-os num lugar secreto na terra, deixando os Ciclopes e os Titãs em liberdade. Géia enfurecida com o seu favoritismo, convenceu seu filho, o Titã Cronos, a derrotar seu pai. Ele castrou Urano e de seu sangue Géia trouxe à vista os Gigantes e as três deusas da vingança, as Erínias. A última e mais terrível concepção de Géia foi Tífon, um monstro de cem cabeças que, embora conquistado por Zeus, vomitava rios de lava do Monte Etna.
Hebe
Deusa da juventude, filha de Zeus e Hera. Durante muito tempo Hebe foi a copeira dos deuses, servindo a eles seu néctar e ambrosia. Foi substituída neste trabalho por Ganímedes, príncipe troiano. De acordo com um relato, ela renunciou à tarefa de copeira dos deuses para se casar com o herói Heracles. Em outra história, foi destituída desta posição por causa de uma queda que sofreu enquanto atendia aos deuses.
Hécate
Deusa da escuridão, a filha do Titã Pérses e Astéria. Diferente de Ártemis, que representava o luar e o esplendor da noite, Hécate representava a sua escuridão e seus terrores. Em noites sem luar, acreditava-se que ela vagava pela terra com uma matilha de uivantes lobos fantasmas. Era a deusa da feitiçaria e era especialmente adorada por mágicos e feiticeiras, que sacrificavam cães e cordeiros negros a ela. Como deusa da encruzilhada, acreditava-se que Hécate e seu bando de cães assombravam lugares lúgubres que pareciam sinistros aos viajantes. Na arte, Hécate era frequentemente representada tanto com três corpos ou três cabeças e com serpentes em torno de seu pescoço.
Hefaístos
Deus do fogo e dos trabalhos manuais, filho de Zeus e Hera, ou às vezes apenas o filho de Hera. Em contraste com os outros deuses, Hefaístos era manco e desajeitado. Logo após seu nascimento ele foi expulso do Olimpo, ou por Hera, devido a sua deformidade, ou por Zeus, porque Hefaístos colocou Hera contra Zeus. Outras lendas, entretanto, contam que ele era venerado no Olimpo e foi casado com Afrodite, deusa do amor, ou com Aglaia, uma das três Graças. Como artesão entre os deuses, Hefaístos fabricava armaduras, armas e joias. Sua oficina acreditava-se estar sobre o Monte Etna, um vulcão da Sicília. Hefaístos frequentemente é identificado com o deus do fogo romano, Vulcano.
Hélios
Antigo deus sol, filho dos Titãs Hiperião e Téia, e irmão de Selene, deusa da lua, e Eos, deusa da alvorada. Acreditava-se que Hélio andava diariamente em sua carruagem dourada através dos céus, dando luz aos deuses e aos mortais. À noite ele mergulhava no oceano ocidental, do qual ele era carregado numa taça dourada para seu palácio no leste. Hélio sozinho podia controlar os cavalos ferozes que puxavam sua carruagem ardente. Quando seu filho Faetonte convenceu Hélio a deixá-lo guiar a carruagem através do céu, Faetonte morreu. Como é o único deus que pode ver toda a Terra do alto do céu, é o único que tudo sabe, e informa aos outros sobre certos segredos; e foi justamente por ter revelado a Hefaístos que Afrodite o traía com Ares que a deusa vingou-se dele, inspirando paixões funestas em seus descendentes: em sua filha Pasifaé e suas netas Ariadne e Fedra. Hélio foi largamente adorado por todo o mundo grego, mas seu principal culto estava em Rodes. Uma das Sete Maravilhas do Mundo, o Colosso de Rodes, era uma representação de Hélio.
Hera
Rainha dos deuses, a filha dos Titãs Cronos e Réia, e a irmã e esposa de Zeus. Hera era a deusa que protegia o casamento e a protetora de mulheres casadas. Era a mãe de Ares, deus da guerra; Hefaístos, deus do fogo; Hebe, deusa da juventude; e Eileitia, deusa do parto. Hera era uma esposa ciumenta, que frequentemente perseguia as amantes de Zeus e seus respectivos filhos. Ela nunca esquecia uma ofensa e era conhecida por sua natureza vingativa. Zangada com o príncipe Páris por preferir Afrodite, deusa do amor, a si, a deusa ajudou os gregos na Guerra de Tróia e não sossegou até que Tróia fosse destruída. Hera frequentemente é identificada com a deusa romana Juno.
Hermafrodito
Filho de Hermes e Afrodite, cujos nomes compõe o seu. De uma enorme beleza, inspirou forte paixão à ninfa Salmácis, que pediu aos deuses para nunca mais se separarem; estes juntaram os dois amantes em um só corpo, criando um andrógino, isto é, um ser dotado de dois sexos.
Hermes
Mensageiro dos deuses, filho de Zeus e de Maia, a filha do Titã Atlas. Como servente especial de Zeus, Hermes tinha sandálias com asas, um chapéu alado ou vara mágica, entrelaçado por cobras e coroado com asas. Conduzia as almas dos mortos ao mundo inferior e acreditava-se possuir poderes mágicos sobre o sono e os sonhos. Hermes era também o deus do comércio e o protetor dos comerciantes e dos rebanhos. Como a divindade dos atletas, ele protegia os ginásios e estádios e atribuía-se a ele a responsabilidade pela fortuna e a riqueza. Apesar de sua característica virtuosa, ele era também um inimigo perigoso, astuto e ladrão. No dia de seu nascimento ele roubou o gado de seu irmão, o deus Apolo, obscurecendo sua trilha e fazendo o rebanho caminhar devagar, atrasando-o. Quando inquirido por Apolo, Hermes negou o roubo. Os irmãos finalmente se reconciliaram quando Hermes deu a Apolo sua mais nova invenção: a lira. Hermes foi representado na arte grega como um homem barbudo e adulto; na arte clássica ele era representado com uma juventude atlética, nu e sem barba.
Hespérides
As filhas do Titã Atlas ou da Noite. Ajudadas por um dragão, as Hespérides vigiavam uma árvore com ramos e folhas de ouro, que produzia maçãs douradas. A árvore tinha sido dada a deusa Hera no dia de seu casamento por Géia, a Mãe-Terra. Um dos 12 trabalhos impostos à Heracles era trazer de volta as maçãs douradas das Hespérides.
Himeneu
Deus do casamento, filho de Apolo. Personificação do cantos núpcias.
Hipnos
Deus do sono, filho de Érebo e da Noite e irmão gêmeo de Thanatos, a Morte.
Íris
Deusa do arco-íris, filha do Titã Taumas e de Eléctra, filha do Titã Oceano. Como mensageira de Zeus e sua esposa Hera, Íris deixava o Olimpo apenas para transmitir os ordenamentos divinos à raça humana, por quem ela era considerada como uma conselheira e guia. Viajava com a velocidade do vento, podia ir de um canto do mundo a outro, ao fundo do mar ou às profundezas do mundo subterrâneo. Embora fosse irmã das Harpias, terríveis monstros alados, Íris era representada como uma linda virgem com asas e mantos de cores brilhantes e um halo de luz em sua cabeça, deixando no céu o arco-íris como seu rastro. Para os gregos, a ligação entre os homens e os deuses é simbolizada pelo arco-íris.
Morpheu
Deus dos sonhos, filho de Hipnos, deus do sono. Morpheu formava os sonhos que vinham para aqueles que adormeciam. Ele também representava seres humanos em sonhos.
Musas
Nove deusas e filhas de Zeus e de Mnemósina, a deusa da memória. As Musas presidiam as artes e as ciências e acreditava-se que inspiravam todos os artistas, especialmente poetas, filósofos e músicos. Calíope era a musa da poesia épica, Clio da história, Euterpe da poesia lírica, Melpômene da tragédia, Terpsícore das canções de coral e da dança, Erato da poesia romântica, Polímnia da poesia sagrada, Urânia da astronomia, e Tália da comédia. Eram as companheiras das Graças e de Apolo, o deus da música. Sentavam-se próximas ao trono de Zeus, rei dos deuses, e cantavam sobre sua grandiosidade, a origem do mundo, seus habitantes e os feitos gloriosos dos grandes heróis. As Musas eram adoradas por todo a Grécia antiga, especialmente em Helicon, na Beócia e em Pieria, na Macedônia.
Nêmesis
Personificação da justiça divina e a vingança dos deuses, às vezes chamada a filha da Noite. Representava a raiva justa dos deuses contra o orgulho e a arrogância e contra os transgressores da lei; distribuía a boa ou má sorte a todos os mortais. Ninguém podia escapar de seu poder.
Nereu
Deus do mar, filho do deus do mar Ponto e Géia, a Mãe-Terra, conhecido como o velho homem do mar. Foi casado com Dóris, uma das filhas do Titã Oceano, com quem teve 50 lindas filhas, as ninfas do mar, conhecidas como Nereidas. Nereu vivia no fundo do mar.
Nikê
Deusa da vitória, filha do Titã Pallas e do rio Estige. Nikê lutou com Zeus na batalha contra os Titãs, e na arte Grega às vezes é representada como a vitória e carregando uma grinalda ou palma da vitória.
Pã
Deus dos bosques, dos campos e da fertilidade, filho de Hermes, mensageiro dos deuses, e da ninfa Dríope. Era metade animal, metade homem, com chifres, membros inferiores, cascos e orelhas de bode. Era uma divindade travessa, o deus dos pastores e rebanhos. Um músico maravilhoso, acompanhava com sua flauta, as ninfas da floresta quando elas dançavam. O deus era galanteador, mas sempre rejeitado por causa de sua feiura. Pan assombrava as montanhas e cavernas e todos os lugares selvagens, mas seu local predileto era a Arcádia, onde nasceu. A palavra “pânico” se supõe derivar dos temores de viajantes que ouviam o som de sua flauta durante a solidão noturna.
Perséfone
Filha de Zeus e de Deméter, deusa da terra e da agricultura. Hades, deus do mundo subterrâneo, apaixonou-se por ela, desejando desposá-la. Embora Zeus consentisse, Deméter relutou. Assim, Hades prendeu a virgem quando estava colhendo flores e levou-a para seu reino. Enquanto Deméter vagava em busca de sua filha perdida, a terra ficou desolada. Toda a vegetação morreu e a fome devastou a terra. Finalmente Zeus enviou Hermes, o mensageiro dos deuses, para trazer Perséfone de volta à sua mãe. Antes de deixá-la partir, Hades pediu que comesse de uma semente de romã, o alimento dos mortos. Assim, ela foi compelida a retornar ao mundo subterrâneo por três meses de cada ano. Como deusa dos mortos e da fertilidade da terra, Perséfone era uma personificação do renascimento da natureza na primavera.
Posêidon
Posêidon, deus do mar, filho dos Titãs Cronos e Réia, e irmão de Zeus e Hades. Posêidon era o marido de Anfitrite, uma das Nereidas, com quem ele teve um filho, Tritão. Entretanto, Posêidon teve inúmeros outros casos de amor, especialmente com ninfas de riachos e fontes, e teve filhos conhecidos pela sua selvageria e crueldade, entre eles o gigante Orion e o Ciclope Polifemo. Posêidon e Górgona Medusa eram os pais de Pégaso, o famoso cavalo alado. Posêidon aparece proeminentemente em inúmeros mitos antigos e lendas. Disputou sem sucesso com Atena, deusa da sabedoria, pelo controle de Atenas. Quando ele e Apolo, deus da música, foram enganados de receber suas recompensas depois de terem ajudado Laomedonte, rei de Tróia, a construir os muros da cidade, a vingança de Posêidon contra Tróia não teve limites. Ele enviou um terrível monstro marinho para devastar a terra, e durante a Guerra de Tróia ele ajudou os gregos. Na arte, Posêidon é representado como uma figura majestosa e barbada, segurando um tridente e frequentemente acompanhado por um golfinho. Os Romanos identificaram Posêidon com seu deus do mar, Netuno.
Príapo
Deus da fertilidade, protetor dos jardins e dos rebanhos. Era filho de Afrodite, deusa do amor, e de Dionísio, deus do vinho, ou, de acordo com algumas lendas, de Hermes, mensageiro dos deuses. Foi deformado, ao nascer, por Hera, que tinha ciúmes de sua mãe. Era comumente representado como um indivíduo grotesco com um falo enorme.
Selene
Deusa da lua, filha dos Titãs Hipérion e Téia, e irmã de Hélios, deus do sol. Selene se apaixonou pelo belo jovem Endimião, o qual ela embalava num sono eterno de modo que ele nunca podia sair dele. Na arte, Selene é representada guiando uma carruagem puxada por dois cavalos, ou às vezes, por dois bois.
Urano
Deus dos céus e marido de Géia, deusa da terra. Urano era o pai dos Titãs, dos Ciclopes e dos Gigantes de Cem-Mãos. Os Titãs, liderados por seu regente, Cronos, destronaram Urano e o mutilaram, e do sangue que caiu sobre a terra criou as Erínias (ou Fúrias), que se vingavam dos crimes de patricídio, matricídio e perjúrio. Embora Urano pudesse ter sido adorado como um deus pelos primeiros habitantes da Grécia, ele nunca foi objeto de adoração pelos gregos no que diz respeito ao período histórico.
Zeus
Zeus do céu e regente dos deuses do Olimpo. Zeus corresponde ao deus Júpiter Romano. Zeus foi considerado, de acordo com Homero, o pai dos deuses e dos mortais. Ele não criou qualquer um dos deuses nem dos mortais. Era seu pai no sentido de ser o protetor e regente tanto da família do Olimpo quanto da raça humana. Era o senhor do céu, o deus da chuva, e o ceifeiro das nuvens, aquele que detinha o terrível trovão. Seu pássaro era a águia, sua árvore o carvalho. Zeus presidia sobre os deuses no Monte Olimpo, na Tessália. Seus principais relicários estavam em Dódona, em Epiros, a terra das árvores de carvalho e o relicário mais antigo, famoso por seu oráculo, em Olímpia, onde os Jogos do Olimpo eram celebradas em sua honra a cada quatro anos.
Zeus era o filho mais jovem do Titã Cronos e Réia, e o irmão das divindades Posêidon, Hades, Héstia, Deméter e Hera. De acordo com um dos mitos antigos do nascimento de Zeus, Cronos, temendo que ele talvez fosse destronado por um de seus filhos, engolia-os assim que nasciam. Quando do nascimento de Zeus, Réia embrulhou uma pedra com os cueiros de criança e deu-a a Cronos para que engolisse pensando que fosse seu filho, e ocultou o deus infante em Creta, onde foi alimentado com o leite da cabra Amaltéia e criado por ninfas. Quando Zeus chegou à maturidade, ele forçou Cronos a vomitar as outras crianças, que estavam ávidas para se vingar de seu pai.
Na guerra que se seguiu, os Titãs lutaram ao lado de Cronos, mas Zeus e os outros deuses foram bem sucedidos, e os Titãs foram confinados no abismo do Tártaro. Zeus, a partir de então, dominou o céu, e a seus irmãos Posêidon e Hades foi conferido o poder para dominar o mar e o mundo subterrâneo, respectivamente. A terra seria governada em comum por todos os três. Para Homero, Zeus era imaginado de duas maneiras diferentes. É representado como o deus da justiça e da misericórdia, o protetor dos fracos e o punidor do mau. Como marido de sua irmã Hera, ele é o pai de Ares, o deus da guerra; Hebe, a deusa da juventude; Hefaístos, o deus do fogo; e Ilíthia, deusa do parto. Ao mesmo tempo, Zeus é descrito como um deus que se apaixona por uma mulher a cada instante e usando de todos os artifícios para esconder sua infidelidade da esposa.
Os relatos de suas travessuras eram numerosos na mitologia antiga, e muitos de seus filhos eram o produto de seus casos de amor tanto com deusas quanto com mulheres mortais. Acredita-se que, com o desenvolvimento de um sentimento de ética na vida grega, a ideia de um deus lascivo, algumas vezes um ridículo deus-pai tornava-se desagradável, e então as lendas posteriores tenderam a apresentar Zeus com uma luz mais gloriosa. Seus muitos casos com mortais às vezes são explicados como o desejo dos primeiros gregos a traçar sua linhagem até o pai dos deuses. A imagem de Zeus era representada na escultura como a figura de um rei barbado. A mais célebre de todas as estátuas de Zeus era a colossal em ouro e marfim feita por Fídias, em Olímpia.
Todas as Deusas são uma única Deusa, múltiplas manifestações da Grande Mãe. Cultuar a Grande Deusa pode se manifestar no culto a um ou mais dos arquétipos que a representem nas diversas culturas do mundo. Assim, sejam as Lilith e a Shequinah judaicas, a babilônia Inanna, a havaiana Pele, a chinesa Kwan-In, a japonesa Amateratsu, a inca Ixchel, as africanas Yemanjá e Oyá, ou as hindus Sarasvati e Kali, sempre se estará prestando culto à mesma e única Deusa. As diferentes mitologias enumeram milhares de nomes de Deusas, correspondendo a aspectos ou atributos diversos. Assim, se escolhemos nos conectar com as Deusas Afrodite ou Ishtar ao procurarmos trabalhar a energia do amor, o fazemos porque essas formas dos arquétipos, por disposição de milênios, mais se aproximam dessa energia.
Se precisamos tratar de estudos ou escrita, criatividade nas artes, invocamos Atena ou Saravasti, por exemplo. Muitas bruxas costumam se conectar com Deusas de diferentes mitologias, conforme a necessidade de seus trabalhos. Outras se atém a um panteão determinado e só cultuam as Deusas e Deuses daquela cultura. Ambas as formas de expressão fazem parte dos Caminhos da Deusa. Algumas bruxas preferem se conectar com as Deusas em sua forma mais primitiva, como Mãe Terra, daí utilizarem símbolos das chamadas Vênus pré-históricas, como de Laussel, Willendorf, Deusa serpente de Creta, Deusa do Nilo.
A seguir uma breve lista de Deusas e dos assuntos que lhes são correlatos:
Amor – Afrodite, Astarte, Ishtar, Beltis, Branwen, Freya, Hathor, Isis, Maia, Mari, Oxum, Vênus, Lilith.
Dinheiro, trabalho e negócios – Demeter, Habondia, Cerridwen, Dannu, Gaia, Mãe do Milho, Bona Dea.
Trabalho criativo, artes – Brigid, Cerridwen, Athena, Minemósine, as Musas, Saravasti.
Cura – Brigid, Ísis, Ártemis, Hebe, Higéia.
Lei e Justiça – Atena, Maat, Nêmesis, Têmis, Aradia.
Devoção e compaixão – Kwan Yin, Maria.
Lar e família – Vesta, Hera, Concórdia, Rhea, Tara.
Filhos – Eileithya, Carmenta, Juno.
Proteção – Freya, Diana, Pallas Athena, Maeve.
Trabalho psíquico – Cibele, Hécate, Cerridwen, Neftis, Perséfone, Hel, Ísis.